O PAC REEMPACOTADO

. O governo contra o PAC      
O projeto de transposição das águas do rio São Francisco consta do Programa de Aceleração do Crescimento com investimentos de R$ 6,6 bilhões. Ao contrário de muitos outros projetos, já tem licença ambiental, o que é um avanço notável. Das 353 obras de infra-estrutura previstas no PAC para os próximos quatro anos, cerca de 100 estão no Ibama, à espera da licença. E outras ainda nem chegaram ao Ibama.     
Há garantias de rapidez. Para o final deste mês, depois de amanhã, portanto, estão prometidas as licenças para as duas grandes usinas hidrelétricas do rio Madeira, Santo Antonio e Jirau. Mas faz tempo que o governo promete isso, de maneira que convém esperar.     
Mesmo porque podem vir as contestações. A licença ambiental do projeto do rio São Francisco está sendo contestada no Supremo Tribunal Federal pelo procurador geral da República, Antonio Fernando Souza, além de sofrer a oposição política de diversos aliados do governo.     
Essa situação se repete nos diversos projetos do PAC: oposições internas, restrições ideológicas, burocracias, entraves jurídicos, liminares. A oposição não faria melhor.     
O presidente Lula disse que vai acompanhar com lupa as obras do PAC. Pois precisa de uma pré-lupa para identificar as travas que impedem o lançamento das obras. O edital do projeto do São Francisco, que já deveria ter saído (a última data prevista era para fevereiro), foi adiado para março.     
O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse para este colunista, em entrevista na CBN, que espera destravar três programas importantes lá pelo mês de abril. São eles: a aplicação da nova lei de saneamento, a Parceria Público Privada para duas estradas na Bahia, e o programa de concessão de sete rodovias federais.     
Todos estão atrasadíssimos.     
A lei de saneamento, que acaba de entrar em vigor, foi recebida como grande avanço e anunciada pelo governo como a medida que finalmente abriria espaço para os investimentos tão importantes para a economia e a saúde das pessoas. Pois travou.     
Conforme reportagem do jornalista Ribamar de Oliveira, no Estado, segunda passada, a lei impõe uma série de condições para que as prefeituras contratem obras de saneamento. Precisam criar agência reguladora, conselho fiscalizador e orientador, órgãos executivos, para então apresentar, aprovar e contratar projetos. Não demora menos que dois anos, disseram especialistas.     
Não é tão complicado assim, disse o ministro Paulo Bernardo. Segundo suas informações, a imensa maioria das prefeituras já está preparada. Mas entre as despreparadas encontram-se as duas maiores, de São Paulo e Rio, o que é um enorme problema, admite o ministro.     
Na semana passada, Lula reuniu o pessoal do setor, determinou que encontrem uma saída e observou que, se for preciso, vai chamar governadores e prefeitos para analisar o caso. Ficaram de montar uma comissão para, talvez, encontrar regras de transição para a lei ? a providência que o ministro espera desatar até abril.     
Outra trava apareceu no primeiro projeto de Parceria Público-Privada (PPP), para modernização e ampliação de duas estradas importantes no sul da Bahia, facilitando o acesso de regiões exportadoras a portos. Eis a sequência: o governo Lula discute desde seu início a idéia das PPPs, consideradas um achado; há dois anos, no meio do primeiro mandato, Lula assinou a lei instituindo a modalidade; mais dois anos e está ?quase? pronto o edital de licitação das duas estradas. A última versão, pré-aprovada pela Tribunal de Contas, está com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), encarregada de fazer a concorrência.     
Funcionará assim: a empresa privada vencedora cobrará pedágio, mas respeitando um teto. Como o teto é relativamente baixo, o faturamento não será suficiente para pagar investimentos e manutenção. Assim, o governo federal vai pagar à concessionária até R$ 40 milhões/ano. É esse o modelo das PPPs. Para evitar tarifas e pedágios elevados, o governo entra com uma parte do custo.     
Tudo muito bem, só que o projeto das estradas na Bahia prevê uma rentabilidade para o empreendedor de 12,5% ao ano. E não faz muito tempo, o governo Lula suspendeu o processo de concessão à iniciativa privada de sete rodovias por considerar muito alta a taxa de retorno prevista, que era de 12,88%, quase a mesma da PPP.     
Neste caso, trata-se de concessão simples, sem parcela do governo. É uma espécie de privatização. A empresa vencedora fica dona da estrada por 30 anos, pagando para o governo algo como luvas e aluguel. Financia-se e obtém lucro com a cobrança do pedágio.     
A discussão, nos dois caso, é meio técnica, meio ideológica. Do ponto de vista técnico, há questões relevantes. Por exemplo: qual o critério de escolha do vencedor? Quem pagar a maior remuneração para o governo ou quem oferecer o menor pedágio? No caso das PPPS, quem oferecer o menor pedágio ou pedir menos compensação do governo?     
O problema político aparece porque, afinal, se trata de um tipo de privatização ? coisa que o PT e seus aliados demonizaram. No caso das concessões de rodovias, há um entrave adicional: três estradas ficam no Paraná, onde o governador Roberto Requião dedica boa parte de seu tempo a azucrinar a vida das concessionárias de estradas já pedagiadas.     
Dessa visão ideológicas nasce a contestação às margens de retorno. Nos setores técnicos, 12,5% não é considerado elevado. Além disso, há um leilão onde os  concorrentes podem pedir menos, se houver essa capacidade entre as empreiteiras brasileiras. O mercado resolveria ? mas é disso que o pessoal não gosta, do mercado e do lucro das concessionárias. O risco é o governo apertar tanto as margens que não encontre interessados. Ou só encontre picaretas, que topem entrar em um negócio que sabem não rentável, com a expectativa brasileira do ?depois se quebra o galho?, sabe-se como. A ver. O ministro Paulo Bernardo acredita que até abril também o edital das concessões de rodovias estará na praça. São investimentos elevados, R$ 3,8 bilhões. Tudo isso estava em andamento havia quatro anos. Foi tudo reempacotado e incluído no PAC, na expectativa de que agora vai. Vai?   Publicado em O Estado de S.Paulo, 26 de fevereiro de 2007

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