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No lugar da China

Carlos Alberto Sardenberg

No ambiente internacional, o presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, não é propriamente um aliado fiel dos Estados Unidos. Ao contrário. Ele se alinha mais à esquerda internacional e não perde oportunidade para manifestar sua oposição a posições norte-americanas. O presidente do México defende Cuba, “país livre e soberano”, não condena a ditadura local e sempre se manifesta pelo fim do embargo dos EUA ao comércio com a ilha. Mas Obrador não rasga dinheiro.

Em 2022, o comércio do México com o Texas foi cinco vezes maior do que as trocas comerciais com toda a América Latina. Um dos três membros do Acordo de Livre Comércio da América do Norte, junto com Canadá e EUA, o México despacha nada menos que 70% de suas exportações para os consumidores e fábricas americanas. Sim, grande parte dessas vendas é produto de empresas americanas (e europeias) lá instaladas. Isso é bom ou é ruim? Para Obrador, certamente é muito bom. Neste momento, em conversas diretas com Elon Musk, o presidente mexicano tenta atrair para seu país a nova mega fábrica da Tesla – investimento de US$ 5 bilhões, mais de 6 mil empregos diretos. Hoje, a maior fábrica da Tesla está em Xangai, na China. OP movimento é significativo. As relações políticas e econômicas entre Estados Unidos e China passam por um momento muito difícil e complexo. De um lado, as relações comerciais e de investimento, construídas ao longo de décadas, são amplas e intensas. Alguns exemplos: entre os aplicativos mais baixados nos EUA recentemente, estão Temu, uma nova marca de roupas, CapCut, para edição de vídeos, e TikTok. O que têm em comum? Todos são chineses.

Temu, por exemplo, não tem nem lojas nem fábricas nos EUA. Manda tudo da China. Até antes da pandemia, essa relação EUA/China seguiu assim, entre desconfianças e tolerância. Afinal, os produtos chineses, antes apenas mais baratos, tornaram-se baratos e de boa qualidade, uma festa para o consumidor. Mas aí começaram a aparecer os problemas, primeiro, geopolíticos, e depois, econômicos. Exemplo importante: nos EUA, o governo, o Congresso, os partidos, os órgãos de segurança desconfiam que as autoridades chinesas usam o TikTok para fazer propaganda contra o Ocidente e para recolher dados pessoais de consumidores ocidentais.

Por isso, vários países discutem a possibilidade de simplesmente banir esse aplicativo. Casos assim se multiplicam, especialmente nas áreas sensíveis de alta tecnologia. Governos dos EUA e seus aliados tratam de reduzir a dominância das companhias chinesas. Estas se defendem à sua maneira. TikTok, por exemplo, mudou sua sede para Singapura e separou suas operações da Douyn, a TikTok local. Não tem sido suficiente. As empresas ocidentais sentem cada vez maior dificuldade em trabalhar nesse ambiente de conflito geopolítico. O presidente Xi Jin Ping apoia a Rússia, inclusive na guerra da Ucrânia, monta um enorme arsenal nuclear, ameaça Taiwan, protegida pelos EUA, e sua ditadura toma atitudes hostis em relação a grandes empresas ocidentais. Sem contar as reviravoltas no ambiente local, como ocorreu com as políticas de combate à Covid. Vai daí, surge no ambiente internacional a tendência “nearshoring” – fazer negócios com os vizinhos, países mais próximos e confiáveis. Eis porque começamos com a história de Elon Musk tratando de colocar sua nova fábrica no México e não na China. Abre-se neste momento uma enorme oportunidade para que países ocidentais tomem o lugar da China. Isso exige estratégia dos governos e das empresas.

A China tornou-se a principal parceira econômica de muitos países, inclusive do Brasil. Qual é o jogo? Manter abertos os canais para vender na China, mas ao mesmo tempo estreitar relações com os países ocidentais desenvolvidos, e suas empresas, que buscam parceiros próximos e confiáveis. O México está jogando, inclusive no quesito do equilíbrio macro. A dívida pública está em 50% do PIB. No Brasil, 74%, com viés de alta. E a diplomacia brasileira está mais para ideológica partidária do que pragmática pelos interesses do país.

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