MEIO AMBIENTE E CRESCIMENTO

. Impasse ambiental Nos países que passaram ou passam por um período de crescimento acelerado, as preocupações com o meio ambiente apareceram depois. A Inglaterra poluiu o rio Tamisa com indústrias e expansão urbana, a França, o Sena, a Alemanha, o Reno e o Danúbio, para depois gastarem quantidades enormes de dinheiro para limpá-los. A Coréia do Sul e os demais tigres asiáticos começam a agora, tardiamente, a tratar mais a sério de danos ambientais. E a China, o país que mais cresce no mundo, não está nem aí. Simplesmente toca o pau na expectativa de que o território é grande, há muitos recursos para queimar e que depois se dá um jeito nos estragos. Aliás, a China também não dá a menor para direitos trabalhistas e sociais. Certamente houve acertos importantes de política econômica, mas não se pode entender o “milagre chinês” sem registrar que lá não tem CUT, Força Sindical, Greenpeace, Procon, muito menos promotores e procuradores do consumidor e do meio ambiente. No Brasil, para limitar este artigo à questão ambiental, a consciência ecológica, a legislação ambiental e o Ministério Público vieram antes do desenvolvimento. Por um bom princípio: não há a menor dúvida de que é melhor crescer de modo equilibrado e sustentado. Quando se pensa ao longo de gerações, não faz sentido destruir tudo para depois tentar consertar. Prevenir custa dinheiro, mas os ambientalistas insistem que, no final das contas, o custo de cuidar do ambiente durante o processo de crescimento termina sendo menor. São cálculos difíceis, pois baseados em hipóteses sobre como as coisas seriam, mas de todo modo parece razoável supor que se gasta menos prevenindo do que consertando. Sem contar que um crescimento destruidor pode deixar perdas irreparáveis. O problema está no tempo. O desenvolvimento sustentado, com respeito ambiental, custa mais antes, além de ser mais lento. A economia e o sucesso se materializarão lá na frente. O custo maior se paga no momento do esforço de crescimento, quando os recursos (humanos, financeiros e tecnológicos) são mais escassos e quando se tem pressa de gerar riqueza e empregos. Eis o dilema que, de certo modo, explica a escolha feita por certos países. Não que sejam dirigidos por um bando de loucos, mas, pesadas necessidades e recursos, escolhem mais poluição agora em troca de crescimento acelerado. O Brasil não está nessa rota. Construiu-se aqui uma ampla instituição ambiental. Não apenas se formou uma consciência ecológica, forte na mídia, como se definiram leis e órgãos privados e públicos, chegando-se até ao Ministério do Meio Ambiente. Com poderes. Mas faltam recursos para que esses órgãos apliquem a legislação de modo eficiente. O resultado prático é desastroso: uma incrível série de impasses ambientais que bloqueiam obras e projetos de importância para o crescimento econômico. Outro dia, o grupo do empresário Antonio Ermírio de Moraes devolveu a concessão para a construção de uma hidrelétrica na Amazônia. Motivo: não conseguiu autorização dos órgãos de meio ambiente. Não que estes tenham vetado a usina, simplesmente não decidiram. A demora foi tanta que o grupo construtor perdeu o interesse pela obra, por cuja concessão pagava. Outro exemplo: a estrada São Paulo/Curitiba, no trecho paulista. As obras de duplicação estão paradas há anos, porque não se ata nem desata o problema ambiental. Ou ainda, as obras de despoluição do rio Pinheiros, na cidade de S.Paulo, também bloqueadas por um impasse desse tipo. Pesquisadores da Embrapa reclamam que o Ibama simplesmente não consegue responder às demandas de autorização para pesquisas com transgênicos. A Usina Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, com capacidade de gerar 12 mil MW, é essencial no planejamento do Ministério de Minas e Energia. Todo mundo sabe que se não houver investimento agora, o país não crescerá por falta de energia dentro de quatro, cinco anos. Belo Monte é considerada por engenheiros como um exemplo de projeto moderno, com prejuízos mínimos ao meio ambiente. Também está bloqueada no Ministério do Meio Ambiente. Há ambientalistas xiitas que simplesmente querem banir hidrelétricas, estradas e rodovias de toda a Amazônia. Já os dirigentes dos órgãos ambientais, incluindo a ministra Marina Silva, afirmam que seu objetivo não é travar o crescimento, mas apenas garantir que seja sustentado. Tudo bem, mas como os órgãos competentes não têm estrutura suficiente para atender às demandas – faltam funcionários, tecnologia e dinheiro – a coisa empaca. Sem os estudos adequados, os funcionários não se arriscam a liberar obras e pesquisas. Como não conseguem concluir os estudos, pára tudo, inclusive porque o Ministério Público entra na parada. A solução ideal, claro, seria aparelhar adequadamente esses órgãos ligados ao meio ambiente. Mas isso também custa dinheiro – no caso, dinheiro público, do orçamento. E aqui, o Meio Ambiente disputa verbas com a Saúde, Educação, Fome Zero, Bolsa Família. Considerando que todo o setor público vive apertado, com recursos modestíssimos para investimentos, e considerando que aparelhar a estrutura do Meio Ambiente vem no fim da fila dos recursos orçamentários, a conclusão é dura, mas inevitável: essa estrutura nunca estará pronta para atender a demanda formada por projetos, obras e pesquisas, que devem aumentar na medida em que aparecem as oportunidades de crescimento, como estão aparecendo neste momento. Eis onde nos metemos: a lei ambiental exige práticas, estudos, relatórios e testes que os órgãos públicos não têm e não terão condições de atender. Se não houver flexibilização da regra e da prática ambiental, a pressão por mais crescimento radicalizará pelo outro lado, à chinesa. Publicado em O Estado de S.Paulo, 10 de novembro de 2003

Deixe um comentário