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O desembarque

O desembarque

 

Carlos Alberto Sardenberg

 

 

Tomara que o prefeito do Rio, Eduardo Paes, esteja certo. Ao contrário de um monte de gente que teme pelo pior com as manifestações bolsonaristas do 7 de setembro, Paes disse para a Malu Gaspar: “Posso estar absolutamente cego, equivocado. Mas a minha impressão é de que não vai ter nada. Vai ter uma cota grande de irresponsáveis, que defendem teses estapafúrdias, golpe militar, AI-5. Nem eles sabem do que estão falando, essa é a verdade”.

Seria o melhor para o país e, claro, o pior para Bolsonaro e sua turma, incluída a família.

E o que seria o pior para o país? Motins de policiais militares e caminhoneiros tentando parar tudo.

Se a gente lembrar que o então deputado Jair Bolsonaro já apoiou motins e baderna de caminhoneiros, parece claro que há uma chance de se realizar esse pior cenário. O presidente colabora para isso todo dia.

O que fazer para impedi-lo?

Primeiro, os governadores estaduais têm uma tarefa crucial: manter o controle sobre suas PMs, mandando os policiais para a rua para evitar a baderna e não para ajudar os golpistas.

Parece óbvio dizer isso. E é mesmo.

Mas não é também uma obviedade quando o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, neste caso representando outras autoridades, diz que não se negocia a democracia?

Eis o ponto a que chegamos. Presidentes de instituições da República, líderes políticos, empresários, banqueiros, membros de destaque da sociedade civil e do mundo econômico precisando vir a público para defender  a democracia e a paz entre os poderes.

Isso era para ser um ambiente dado por todos. Aqui é democracia e ponto final. Os governadores mandam nas PMs e ponto final.

Mas é por causa do presidente Bolsonaro. Em vez de governar e de lidar com uma sequência de dificuldades econômicas, ele passa o tempo estimulando os seus golpistas e a  sua tropa de choque.

Ainda assim, nos diversos manifestos e pronunciamentos em prol da democracia, muita gente tem medo  de dizer que se trata, sim, de uma crítica e  uma resposta explícita aos desatinos bolsonaristas.

Isso vale para boa parte do PIB. A turma aqui se dividiu. Pode-se dizer que a ampla maioria já desembarcou do governo Bolsonaro e do assim chamado liberal Paulo Guedes. Parte desse grupo, entretanto, ainda não assumiu.

Sabe como é. A economia brasileira tem muito Estado e, pois, muito negócio com o governo federal e com as empresas e bancos públicos. Daí a quase irresistível tendência governista de boa parte dos representantes da produção e das finanças.

Vale para qualquer governo, de Lula e Temer a Bolsonaro das eleições e dos primeiros meses.

Ocorre que Bolsonaro é tão ruim para o país, a sociedade e a economia, que mesmo os mais governistas e mais temerosos estão desembarcando dessa canoa.

Mas assim como os governadores precisam cumprir a tarefa básica de controlar as PMs, o PIB, a sociedade e as lideranças políticas precisam conter as loucuras do presidente Bolsonaro.

Como?

Primeiro, dizendo isso clara e publicamente. Segundo, recorrendo aos instrumentos disponíveis (impeachment, denúncias nos tribunais, pressão no Legislativo, campanhas etc.).

Faltam três dias para o 7 de setembro e as ameaças dos bolsonaristas. Há tempo para erguer uma barreira de contenção.

Necessária porque o presidente, sua família, sua tropa estão sendo cercados por diversos lados. Correm os inquéritos no STF, as investigações do Ministério Público sobre as rachadinhas, funcionários fantasmas e, pois, lavagem de dinheiro. Acrescente-se aí a CPI que a cada dia descobre mais picaretagem e roubalheira em negócios com o governo, especialmente na área da saúde.

Na área da saúde, gente. Ali mesmo onde se deveria encontrar uma ação organizada para conter o vírus.

Em vez disso, temos o ministro da Saúde dizendo ser contra a exigência de certificado e do uso de máscaras.

Passaram muito além do limite.