Contas públicas, juros e salários

Contas públicas, juros e salários
Não serve
Se for necessário encontrar uma política de comunicações ruim, a do governo federal não serve. Ela é muito ruim.
Propiciou um exemplo máximo na quinta-feira, 18. Enquanto os ministérios da Fazenda e do Planejamento, pedindo desculpas pelo incômodo, comunicavam um corte de R$ 7 bilhões nas despesas previstas no Orçamento 2000, incluindo redução de gastos em programas sociais, o Banco Central, animado, informava que o setor público havia alcançado um superávit primário recorde de R$ 13 bilhões só no primeiro trimestre.

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Eis a mensagem transmitida: o governo é dirigido por um bando de loucos; está sobrando dinheiro nas contas do dia-a-dia, mas eles continuam cortando gastos essenciais.
Faltando, não sobrando
A notícia sobre o superávit primário (veja o que é na seção Entenda a Economia) está correta. O setor público como um todo ? governos federal, estaduais e municipais ? conseguiu poupar R$ 13 bilhões nas despesas correntes e de investimentos nos primeiros três meses do ano.
Não quer dizer que esse dinheiro está sobrando. Foi integralmente utilizado no pagamento de juros ? e ainda ficou faltando. A despesa com juros no mesmo período foi de R$ 18,2 bilhões. A diferença foi empurrada para a frente.
Essa despesa com juros vem do endividamento feito no passado, que teve diversas causas. A principal causa histórica é que o governo costumava gastar mais do que arrecadava.
A causa mais recente foi a política cambial praticada de 1995 até janeiro de 99. Para atrair dólares e com eles sustentar a cotação do real, o governo ofereceu juros elevados aos investidores externos. Esses juros incidiram sobre uma dívida já existente e o governo foi tomando empréstimo novo para para pagar juros de dívida antiga. A inflação acabou, mas o endividamento público aumentou. São os pesos e contra-pesos de uma política econômica.
De todo modo, aí está dívida pública que precisa ser amortizada e controlada. Como qualquer família ou empresa endividada, o governo também precisa economizar na despesa corrente para amortizar a dívida.
Orçamento
O fato é que o governo federal não vai gastar menos do que no ano passado. Vai gastar mais.
Os cortes anunciados referem-se ao Orçamento aprovado pelo Congresso, que contem previsões exageradas. Os parlamentares, como acontece todo santo ano, aumentaram a previsão de receita para poder “acomodar” ? como dizem em Brasília ? gastos de interesse das bases eleitorais.
Além disso, ministros políticos, indicados por partidos, conseguiram que seu pessoal aumentasse verbas de suas pastas. Só que isso é apenas para a torcida.
O Orçamento, no Brasil, é “autorizativo” ? quer dizer, o governo federal pode gastar aquilo que o Congresso estipula … se quiser.
Assim, todo ano, depois que o Congresso aprova a Lei do Orçamento, os ministérios da Fazenda e do Planejamento preparam o decreto de execução orçamentária, que é o que vale.
Tudo considerado, a lógica é o seguinte: o setor público como um todo tem que fazer neste ano um superávit primário de R$ 36,7 bilhões para pagar juros.
Precisa ainda privatizar. A receita da privatização será utilizada para abater o principal da dívida.
O objetivo é reduzir progressivamente o envidamento público.
É o que está no acordo com o FMI e é importante que se cumpra. O maior problema da economia brasileira sempre foi o desequilíbrio das contas públicas, uma fonte primária de inflação.
Salários e juros
Tirante categorias do Legislativo e do Judiciário, que ganham bem, e grupos de marajás que conseguiram sabe-se lá como vantagens extraordinárias, a verdade é que a grande maioria do funcionalismo ganha mal.
No Executivo federal, o salário-base mais alto fica em torno de R$ 6 mil, isso para funcionário no topo da carreira.
Professores universitários, como doutorado, ganham menos de R$ 4 mil.
Está errado, claro.
Mas olhemos o outro lado da equação: o governo gasta muito com pessoal e aposentados ? e esse gasto é crescente. Tome-se o caso das universidades: gastam quase toda sua receita com a folha de pessoal e aposentados.
Eis o dilema, a grande crise do setor público: o governo toma muito imposto da sociedade, gasta muito com pessoal e aposentados, e o pessoal ganha mal.
É um enorme problema, a exigir soluções mais profundas do que uma guerra entre polícia e manifestantes na principal avenida de São Paulo.

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