. — Seguindo a cartilha, de FHC a Lula
A economia brasileira decolou quando o produto mundial crescia a taxas raríssimas de 5% ao ano e o comércio global de mercadorias e serviços se expandia a um ritmo em torno dos 10%, ainda mais inédito.
O Brasil perdeu o embalo e desacelerou a fortemente a partir de outubro de 2008, quando a economia global entrou em recessão.
Teria sido apenas coincidência?
Observem estes números: em 2003, a Vale exportava US$ 765 milhões de minério de ferro para a China no ano passado, foram nada menos que US$ 4,9 bilhões.
Claro que o país não cresce apenas por causa das exportações. Ao contrário, a demanda doméstica brasileira vinha crescendo a um ritmo quase chinês perto de 10% ao ano.
Mas a atividade exportadora multiplica negócios internos. Imaginem a quantidade de pessoas e empresas trabalhando aqui no Brasil para que a Vale vendesse minério de ferro na China.
Outra conexão: a Petrobrás ganha dinheiro com o petróleo encarecido pela explosão do consumo mundial de combustíveis. Aliás, até 2003, o Brasil não exportava um litro de óleo para a China. Em 2007, vendeu US$ 1,7 bilhão.
Com esse dinheiro, a Petrobrás acelera a exploração e produção no Brasil, gerando demanda doméstica.
Outro exemplo: em 2007, auge do crescimento mundial, as empresas privadas brasileiras captaram R$ 160 bilhões com a emissão de ações, debêntures, notas promissórias e outros títulos. Foi tudo no mercado doméstico, mas dinheiro trazido na maior parte por investidores estrangeiros, nas rodadas da ciranda financeira.
Sabem quanto as empresas haviam captado em 2003? R$ 13 bilhões.
No ano passado, essas captações ainda deram alguma coisa até setembro. Depois, sumiram.
Claramente, a globalização puxou o Brasil, assim como trouxe quase todas as nações do mundo para um ritmo de crescimento muito forte. A festa foi para todos, ricos, emergentes e pobres. Entre os emergentes, um padrão idêntico: rápido crescimento das exportações e recebimento de bilhões de dólares em investimento externo direto e outros bilhões em financiamento e aplicações em bolsas de valores.
O período foi tão bom que cresceram até os países com governos ruins mas que tinham alguma coisa para vender no mundo, fosse a carne da Argentina, o petróleo da Venezuela, o gás da Ucrânia.
O presidente Lula e seus ministros contam aqui uma outra história. Dizem que o Brasil cresceu e vai continuar crescendo por causa do PAC e dos gastos sociais de seu governo.
Mas, como disse Miriam Leitão no seu comentário na CBN, ontem, se o PAC está funcionando tão bem, com as obras em dia e agora com mais investimentos, por que as empresas estão parando e desempregando?
O PAC é só propaganda.
Tome o caso do metrô de S.Paulo, um empreendimento do governo paulista, com dinheiro do Estado, da prefeitura de S.Paulo, de empreiteiras privadas e mais financiamentos locais e externos, com uma pequena parte de recursos federais.
Não estava no PAC, agora foi incluído.
O que muda?
Nada. A obra continua do mesmíssimo jeito, sujeita às mesmas condições, controlada pelo governo paulista, e dependendo das condições gerais da economia.
A única diferença é que passa a chamar-se obra do PAC. E assim o presidente vende à população a tese de que seu governo está combatendo a crise que veio de fora.
Mas Lula tem razão em dizer que o país está mais bem preparado para enfrentar a crise. Ao contrário das crises anteriores, desta vez o Brasil não vai quebrar.
E sabem por quê? Porque cumpriu os principais preceitos do Consenso de Washington, a saber: equilíbrio fiscal, com superávit primário para pagar a conta de juros e reduzir o endividamento público regime de metas de inflação com Banco Central independente na prática câmbio flutuante, que facilitou a aquisição de reservas e privatizações, retomadas por Lula com as concessões de estradas, ferrovias, portos e usinas hidrelétricas.
Isso garantiu a estabilidade macroeconômica, reconhecida pelo mercado global, que nos concedeu o título de grau de investimento.
Eis a receita real: globalização e Consenso de Washington.
O resto é propaganda, que pega.
Publicado em O Globo, 05 de fevereiro de 2009