O PROGRAMA ECONÔMICO DO PT-5

. O neonacional desenvolvimentismo de Lula (5-final)   O documento “Um outro Brasil é possível”, apresentado pelo Instituto da Cidadania, de Luiz Inácio Lula da Silva, como uma proposta de programa econômico para a oposição, sustenta que novo modelo econômico tem compromisso com o equilíbrio das contas públicas. O que garante essa promessa? As gestões responsáveis de prefeituras e governos estaduais petistas, respondem líderes e economistas do PT. É verdade que há administrações petistas com responsabilidade fiscal, mas acontece que hoje em dia essa responsabilidade é compulsória para os governos estaduais e prefeituras. Legislações – como a Lei de Responsabilidade Fiscal, que impõe regras estritas aos gastos públicos – normas do Banco Central – como as que limitam os financiamentos de bancos ao setor público – e contratos assinados com o Ministério da Fazenda – como os de refinanciamento das dívidas estaduais e municipais – engessam as administrações: sem possibilidade de obter novo financiamento, são obrigadas a gastar apenas o que arrecadam. Na verdade, gastam menos do que arrecadam, pois, por contrato, têm que pagar prestações mensais da dívida antiga ao governo federal. Ora, o documento do Instituto de Cidadania define como “draconianos” esses compromissos aos quais os governadores e prefeitos “sucumbiram”. É o que vivem repetindo os administradores petistas. É razoável concluir daí que um governo federal petista vai aliviar essas amarras e permitir a expansão do gasto público nos estados e municípios. Portanto, é fraco o argumento que apresenta as atuais administrações petistas como exemplos de responsabilidade fiscal. Governos estaduais e municipais, hoje, não podem estourar as contas. Mas o governo federal pode. O presidente da República dispõe da capacidade direta de mudar muita coisa no atual sistema de controle das contas públicas – mandando, por exemplo, o Banco Central afrouxar algumas normas – e, além disso, pode patrocinar projetos de lei que mudem todo o sistema. Mesmo que um governo petista não disponha de maioria no Congresso, ainda assim poderia aprovar tal legislação, pois não há coisa mais fácil de encantar os políticos de qualquer linha do que um aumento do gasto público. E, de fato, o documento “Um outro Brasil . . .” afirma que o modelo petista supõe “um limite de comprometimento das receitas com o pagamento de juros da dívida pública”. É uma proposta delicada, pois embute a possibilidade de calote na dívida pública. Líderes e economistas do PT juram que os contratos serão preservados e que não haverá calotes. Mas se haverá um limite para pagamento de juros, o que acontece se a despesa financeira ficar acima desse limite? Não se paga. E qual é o nome disso? Há ainda uma circunstância agravante. Se o governo tiver 10 reais para pagar 15 reais de juros, será preciso fazer uma fila e/ou estabelecer critérios que digam quem recebe, quem recebe antes e quem não recebe. Eis aí uma fonte de arbitrariedade e de corrupção, que certamente afetará a credibilidade dos títulos da dívida pública. De novo, é preciso salientar que esses títulos não estão apenas com especuladores e banqueiros agiotas, mas, na maior parte, compõem a poupança da classe média brasileira que tem seu dinheiro em fundos de aplicação financeira. Por outro lado, deve-se registrar que o documento do Instituto de Cidadania propõe um outro caminho para se chegar ao equilíbrio das contas públicas. Dois caminhos paralelos, na verdade. De um lado trata-se de reduzir a vulnerabilidade externa, ou seja, o déficit nas contas externas, por meio de um forte aumento nas exportações e restrições às importações e demais saídas de dólares. Sendo menor o déficit externo, as taxas de juros cobradas sobre os papéis brasileiros, lá fora e aqui dentro, devem cair. Com juros menores, diminui a despesa financeira do governo, o item mais pesado. De outro, trata-se de aumentar o gasto público em todos os níveis, de modo que isso promova uma aceleração na economia e, pois, maior arrecadação de impostos, de novo melhorando as contas públicas. Na teoria, os dois caminhos levam ao destino desejado e que constitui o sonho de qualquer governante, à direita ou à esquerda. Quem não gostaria de governar com um enorme saldo comercial e dinheiro para atender às demandas dos cidadão? O diabo são os detalhes da situação prática. Como chegar lá? Eis a incoerência lógica que atravessa todo o documendo do Instituto de Cidadania. Baseia seu modelo em dois pontos, a redução da vulnerabilidade externa e um equilíbrio “sadio” das contas públicas, via expansão de gastos. Mas esses dois pontos não estão dados pela realidade. Ao contrário, todo o problema da política econômica atual é justamente como chegar a eles. Em resumo, a proposta petista diz o seguinte: reduzido e/ou eliminado o déficit externo, reduzida a despesa financeira do governo e com mais crescimento, tudo se resolve. Mas não diz como se realizam aquelas condições. Sem querer ofender, parece uma clássica piada. Pergunta-se ao economista: como transportar este elefante? Resposta: vamos supor que o elefante tem peso zero … Ou, vamos supor que as contas externas e públicas estejam equlibradas e o país, crescendo . . . Decorrem daí as contradições do texto. Diz que vai estimular a exportação, mas também dirigir a indústria para a produção de bens populares para o mercado interno. Diz que vai desonerar a produção, mas também reduzir a jornada de trabalho e aumentar o custo das horas extras. Diz que vai pagar os compromissos financeiros, mas só até certo ponto. Afirma compromisso com o equilíbrio fiscal, mas se compromete com um brutal aumento do gasto público. Diz que vai reduzir a carga tributária, mas anuncia gastos que demandam mais e não menos recursos. Pode-se argumentar que um programa partidário deve mesmo enunciar os grandes objetivos, deixando as políticas de transição para depois. Mas aí seria preciso dizer que haverá uma transição e que, nesse período, as grandes demandas e promessas ficam adiadas. Por exemplo, em 2003 o país continuará necessitando do aporte de recursos externos para fechar suas contas. Parte desses dólares vem de investimentos diretos, parte vem do FMI, que exige um acordo para emprestar. Lula acaba de rejeitar explicitamente qualquer acordo com o FMI. E será natural que os investidores manifestam alguma desconfiança em relação ao novo governo, pelo menos até conhecerem sua prática. Ou seja, faltarão dólares e, assim, a vulnerabilidade externa deverá aumentar e não diminuir no primeiro momento de um governo petista. em consequência, os juros sobem e sobe a despesa financeira do governo. Ao mesmo tempo, todos os que tiverem ido para o governo junto com Lula vão reivindicar sua parte e a nova administração ficará numa situação delicada. Ou não atende sua base, ou atende e leva a um aprofundamente da crise fiscal e externa. Fácil é desenhar o paraíso, difícil é encontrar o caminho. (Publicado em O Estado de S.Paulo, 30/07/2001. Os quatro primeiros artigos desta série apareceram em edições anteriores do Estado. Podem ser encontrados neste site, no Arquivo, seção Política Econômica).

Deixe um comentário