Se fosse verdade, como disse Lula, que tem uma elite aqui no Brasil “que não gosta de dividir a poltrona do avião com o nosso povo”, então essa elite deveria estar apoiando a presidente Dilma. O povo já foi colocado para fora dos aviões, como mostram os dados do Banco Central, aliás divulgados na mesma terça-feira em que Lula atacava os opositores do governo.
Em janeiro deste ano, os brasileiros gastaram apenas US$ 800 milhões em viagens internacionais, contra mais de US$ 2 bilhões no mesmo mês de 2015.
A diferença, primeiro, está no dólar, cotado a R$ 2,60 um ano atrás, contra os R$ 4,00 de hoje. Com essa taxa de câmbio, só rico e classe média alta pode pagar.
Sim, já sabemos a resposta de Lula: tudo culpa da crise internacional que desvalorizou a moeda dos emergentes. Verdade que houve uma desvalorização geral, mas por que o Real caiu mais, muito mais, que as outras?
Por causa dos equívocos da política econômica de Dilma, cujos primeiros passos foram dados no segundo governo Lula. Com uma recessão, que gera desemprego e medo nos que continuam empregados; e com uma inflação que come o poder de compra das famílias, os mais pobres não foram tirados apenas dos aviões. Foram também afastados dos supermercados e dos shoppings.
Prova? A queda das vendas no varejo.
Se, como diz Lula, os ricos e brancos ficaram incomodados com a chegada do “nosso povo” ao mercado, agora deveriam estar muito satisfeitos com Dilma e o PT por estarem tirando os mais pobres desse mesmo mercado.
Também aqui dá para antecipar a resposta de Lula e seu pessoal. Aliás, já estão dizendo que Dilma se distanciou do PT, quase que aderiu ao neoliberalismo.
É verdade que a presidente anda dizendo algumas coisas de que o PT não gosta – tipo reforma da previdência – mas, vamos reparar: a política econômica que trouxe o país até esta crise, a “nova matriz”, é puro PT e bolivarianismo. Tanto é que muitos petistas estão pedindo que Dilma volte à política que teria sido abandonada desde o ano passado, trocada pelo ajuste fiscal.
Mas qual ajuste? O gasto público aumentou; o déficit aumentou; a dívida bruta aumentou e continua subindo. Isso só é ajuste na cabeça do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, que ontem, aliás, saiu com uma das melhores piadas do ano.
A agência Moodys rebaixou ontem a nota do Brasil, retirando o selo de bom pagador, exatamente pela deterioração das contas públicas e pela falta de políticas efetivas e de um compromisso firme em atacar esse problema essencial.
Pois a Fazenda respondeu que o rebaixamento “não altera o comprometimento (do governo) com o ajuste fiscal”. Quer dizer que o ajuste é esse mesmo que está aí?
Sim, o ministro está propondo um pacotão – algo insuficiente e politicamente inviável que, se produzisse efeito, seria muito lá na frente. Enquanto no momento toma medidas que aumentam o endividamento do governo federal e dos Estados.
Só dá para entender esse raciocínio (?) se a gente levar em conta as palavras do vice-presidente Michel Temer. Ele disse ontem que há muito pessimismo por aqui e que o pessoal fala em crise num sentido muito geral, sem especificar se é administrativa, política ou econômica.
Na verdade, os analistas especificam muito bem. Basta ler, por exemplo, o relatório da Moodys. Mas – quer saber? – nem precisava. Estamos com as três modalidades.
O governo é ruim no administrativo. Basta ver quantos ministros foram trocados, quantas medidas, como o leilão de rodovias e aeroportos, que não são implementadas por pura incompetência.
Na economia, a crise também é muito específica. Temos inflação alta, recessão brava e endividamento público crescente, com juros na lua.
E precisa especificar a crise política? Precisa dizer que a Lava Jato está derrubando o governo e, aliás, ameaça derrubar o próprio Temer no Tribunal Superior Eleitoral?
Na verdade, são quatro crises: as três já citadas e a mental, de falta de lógica mesmo.
Tudo bobagem, diria Temer, o país precisa de uma dose de otimismo, especialmente dos empresários e investidores, ou seja, das elites. Mas se Lula tem razão, essas elites estão contra e não vão ajudar.
Aliás, está aí mais um sinal específico da crise. As elites no governo não se entendem e não sabem como sair dela.