REFORMAS E ABERTURA ECONÔMICA NO BRASIL

. Artigos O ovo e a galinha O que vem antes, as reformas ou a abertura? Nesta semana, o governo brasileiro decidiu que não vai cumprir o cronograma que previa para 2001 a redução das tarifas de importação cobradas de países de fora do Mercosul. Essa tarifa média é de 14% (mas chega a 35% para alguns produtos, como carros) e deveria sofrer uma redução de três pontos percentuais. Ou seja, a indústria local, assim como a argentina, dentro do Mercosul, continua protegida por tarifas altas – e os consumidores locais continuam pagando mais caro por isso. Segundo o ministro do Desenvolvimento, Alcides Tápias, a maior abertura da economia brasileira – isto é, tarifas menores de importação – ocorrerá em 2002. Por que nessa data? Porque o ministro acha que em 2001 acontecerão três coisas importantes para aumentar a competitividade das empresas brasileiras: redução da taxa de juros, redução da carga tributária e redução dos custos trabalhistas. Os juros dependem do bom andamento da economia local, especialmente do ajuste das contas públicas e cumprimento das metas com o FMI, já que parece certo que a inflação está e estará sob controle. Juros dependem ainda do cenário externo (veja nota abaixo). A questão dos impostos tem a ver com a reforma tributária. O governo FHC jura que tem um projeto firme e que vai tocá-lo em 2001 – exatamente a mesma proposta feita nos últimos três anos. Custos da mão de obra têm a ver com a reforma da legislação trabalhista, de modo a flexibilizar as relações de trabalho. Ou, na linguagem dos sindicatos, retirar direitos assegurados na Constituição e na legislação complementar. A idéia, de qualquer modo, é deixar que as relações empresa/trabalhadores sejam basicamente reguladas pela negociação direta. Como se diz, fazer com que o "negociado valha mais que o legislado". Como terá percebido o/a visitante deste site, essas duas reformas são politicamente complexas. Por isso mesmo não saíram até agora. O ministro Tápias conta com uma forte mudança no ambiente para que finalmente sejam aprovadas. E se não forem? Adia-se a abertura, é o que se depreende das palavras de Tápias. E aí caímos na história do ovo e da galinha: o que vem antes, a abertura ou as reformas locais? Parece que resposta certa é reformas locais – afinal, é o argumento, não se pode submeter as empresas brasileiras à concorrência de companhias estrangeiras que produzem pagando menos juros, menos impostos e menos salários. Ou seja, enquanto não se melhoram as condições de competitividade, as empresas locais continuam protregidas da competição por altíssimas tarifas de importação. O diabo é que tal postura se transforma rapidamente numa proteção eterna. Eis como: você condiciona a abertura a reformas que sabe que não serão feitas. Ou, pior ainda, a reformas que o próprio governo sabota ou simplesmente deixa paradas. Isso torna interessante o viés contrário de abordar o assunto: a abertura deve ser feita o quanto antes porque ela força a realização das reformas. Faz sentido. Os empresários locais e muitos amigos reclamam que a abertura da economia brasileira, nos anos 90, foi feita de forma abrupta, quando as companhias locais ainda não estavam preparadas. Mas durante anos e anos se adiava a abertura com esse pretexto. Imposto o choque da abertura, o que se viu? As empresas brasileiras correram atrás e entraram num duríssimo mas altamente proveitoso processo de reformas e ganhos de produtividade e de eficiência. Muitas caíram pelo caminho, mas no geral a economia brasileira tornou-se mais competitiva, mais contemporânea, oferecendo ao consumidor local produtos de maior qualidade e a preço menor. E olha que foi uma abertura parcial. Ainda assim foi um choque que se não tivesse sido imposto – no governo Collor, hein!!! – as empresas até hoje estariam despreparadas. Por outro lado, é verdade que a nova rodada de ganhos de produtividade já não depende tanto das empresas e sim de reformas institucionais, de modo a melhorar o ambiente de negócios. A opção, portanto, é a seguinte: manter a economia fechada enquanto se esperam reformas (difíceis ou mesmo improváveis); ou avançar na abertura, ainda que gradualmente, de modo a criar constrangimentos para a realização das reformas. Porque, observe, a situação atual é boa para muita gente: as empresas pagam muitos impostos, juros e salários e benefícios, mas isso é compensado por tarifas de importação que reduzem a competitividade dos importados; os sindicatos seguram os atuais postos de trabalho e também evitam a competição; o governo não precisa fazer nada, é só deixar rolar. Ninguém corre riscos. Quem perde? O consumidor, que paga mais caro por produtos de pior qualidade. E o país em geral, que perde a oportunidade de crescer mais depressa. Mas essas perdas são de coisas que não acontecem – e isso não é visível a olho nu. Depende de lideranças que consigam vislumbrar o futuro – mercadoria em falta. Assim, o cenário mais provável é ficar tudo na mesma até o próximo presidente. Ou piorar, com mais protecionismo. Com um pequena ajuda dos amigos do mercados Primeiro foi Alan Greenspan, presidente do Fed, o banco central dos Estados Unidos, ao dizer que estava atento à desaceleração da economia americana e que estaria pronto a impedir um pouso brusco ou uma recessão. Bolsas dispararam no mundo todo. (Veja no Arquivo, seção Em Cima dos Fatos, a última nota). Depois, na quinta, o presidente do BC brasileiro Armínio Fraga, disse em Nova York que o ambiente externo estava "mais simpático" com a economia brasileira. A bolsa local disparou, os juros caíram. Com Greenspan, sempre foi assim: ele fala e os mercados se abalam para um lado ou outro. Com Armínio Fraga, está começando. E é boa coisa: uma das funções do BC é justamente dar sinais ao mercado. Não tentar manipulá-lo, porque não consegue a médio prazo, mas indicar como está vendo a situação. Não impede a volatilidade, mas a reduz. Não elimina as tempetades, mas pelo menos não deixa o mercado em vôo cego.

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