REDUÇAO DE JORNADA E DESEMPREGO – UMA IDÉIA SOCIAL

. O presidente Fernando Henrique Cardoso, de Paris, recolocou em pauta o tema da redução de jornada de trabalho como instrumento para elevar o nível de emprego. Em São Paulo, metalúrgicos fazem manifestação, nesta quarta, justamente para forçar negociações em torno da redução da jornada.
Trata-se de uma idéia forte da social democracia e do trabalhismo.
Funciona?
A lógica parece muito simples: se um determinado número de operários passa a trabalhar menos horas por dia, será preciso contratar mais gente para completar o número de horas anterior e, pois, manter a mesma produção.
Por exemplo: uma empresa tem 500 operários que trabalham 40 horas semanais. Dá 20.000 horas/trabalho por semana.
Reduzida a jornada para 36 horas, o total semanal chega a 18 mil horas. Para completar as 20 mil horas, temos 2.000 horas divididas por 36, o que dá mais 55,5 empregados.
Complicando
Agora, como nem tudo que parece simples é verdadeiro, eis as complicações:
Se o custo de contratação for alto, devido aos encargos, e se a legislação trabalhista for muito rígida (dificultando e/ou encarecendo demissões e mudanças na jornada) talvez seja melhor para a empresa buscar a mesma produção com os mesmos operários. Como?
Horas extras, por exemplo, o que agrada os operários já empregados, pois passam a ganhar mais pelas mesmas horas que trabalhavam antes. No exemplo acima, os 500 operários continuariam a trabalhar 40 horas semanais, mas quatro horas seriam extraordinárias. Hora extra, como se sabe, é mais cara.
O resultado dessa operação é um aumento salarial para os operários e um aumento de custo para a empresa. Como, em geral, o custo de aumentar o número de horas extras é menor do que o custo de contratação de novas pessoas, nesse caso a redução de jornada não cria vagas adicionais.
Máquinas
Mas o que as empresas sempre procuram fazer é ganhar produtividade com novas tecnologias de modo a produzir a mesmas coisas com menos horas de trabalho.
De novo, portanto, a redução da jornada pode não gerar novos empregos, mas estimular ainda mais a busca de novas tecnologias. Máquinas são mais baratas a longo prazo ? não faltam, não pagam INSS, não fazem greve. É cruel, mas é assim que funciona.
Em resumo, entre a redução da jornada e o aumento de número de vagas vai um oceano de ressalvas.
Por isso é um tema controvertido.
O caso francês
De uns tempos para cá, o pessoal pró-redução usa como exemplo o caso francês. O governo socialista de Leonel Jospin reduziu a jornada para 35 horas e o desemprego caiu na França, depois de anos de estagnação em nível elevado.
Pode-se, entretanto, concluir que a redução da jornada foi a causa principal do aumento de empregos?
A resposta é não.
O principal argumento: o desemprego caiu ao mesmo tempo em todos os países da União Européia – e só a França reduziu a jornada.
Além disso, em outros países não só não houve redução de jornada, como houve a flexibilização da legislação trabalhista, que é, por assim dizer, a política oposta (neo-liberal) de reduzir os direitos trabalhistas.
Alguém pode argumentar: mas na França o desemprego caiu mais.
Errado: o desemprego caiu mais na Espanha, que não reduziu jornada e flexibilizou a legislação, permitindo contratações temporárias, com tempo parcial e menos direitos, etc.
Confira os números:
  Desemprego hoje Um ano atrás França 10% 11,3% Espanha 14% 16,6% Alemanha 8,4% 10,6% Holanda 2,9% 3,4% Áustria 3,3% 4,5% Inglaterra 5,8% 6,2%       Fonte: Eurocast (instituto de estatísticas da União Européia) e revista The Economist
Euro fraco
Note-se que a Holanda têm os menores números. Lá, a legislação trabalhista é mais flexível do que no conjunto da Europa continental. E a Holanda, antes da flexibilização, tinha taxas de desemprego "européias" ? na faixa dos 10%.
Por outro lado, foi na Inglaterra que a taxa de desemprego caiu menos (já que na Holanda não dá para cair mais). E isso pode ser uma dica.
Estão crescendo em ritmo mais forte na Europa os países que aderiram à moeda única. O euro se desvalorizou fortemente (em relação ao dólar, iene e libra) e isso tornou mais competitivos os produtos desses países. Com isso cresceram as exportações, que é a base do crescimento e, pois, da geração de empregos.
Em resumo, o que há em comum entre os países da União Européia é, na base, um ajuste fiscal feito antes, como condição de entrada no sistema de moeda única. E, depois, um euro desvalorizado a impulsionar as exportações em economias que já eram fortemente exportadoras.
A Inglaterra não aderiu ao euro e tem os mais baixos níveis de desemprego. Mas isso vem de muito antes. Quando toda a Europa exibia taxas de desemprego bem acima dos 10%, a Inglaterra, desde a era Thatcher, já estava lá em baixo.
E dos países europeus, a Inglaterra é a que tem a legislação trabalhista mais flexível.
Para arrematar: entre os países desenvolvidos, os menor índice de desemprego está nos Estados Unidos (4,1%). E lá quase não há legislação trabalhista.
Dá o que pensar não é mesmo?
Custos
Para funcionar como estímulo ao emprego, a redução de jornada precisa ser complementada com algumas medidas. Por exemplo: proibição de aumento de horas-extra; desestímulo ao uso de novas tecnologias; estímulo à contratação.
O problema é que tudo isso encarece o custo de produção, torna a indústria menos competitiva.
Ou então, se permite trocar a redução de jornada por outros benefícios trabalhistas. Na França foi assim: em negociações, as empresas que reduziram a jornada puderam retirar alguns benefícios (redução de dias de férias e alguns adicionais, por exemplo) de modo a compensar o aumento de custo.
É preciso contar também este lado da história.

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