RECEITA PARA DERRUBAR JUROS E CRESCER

–Duas medidas, a independência da BC e gastar menor, e o Brasil decola–

Não sou candidato a nada, mas seguem aqui algumas propostas para o próximo governo. Vão de graça, mesmo porque é duvidoso que algum candidato ou candidata tope pagar por elas. O objetivo é promover uma segunda onda de reformas e uma nova onda de investimentos em infraestrutura e serviços públicos para dar conta do crescimento do país.
Não tem aqui nenhuma idéia nova, nem ?solução à brasileira?. É tudo cópia do que deu certo em outros países, em situação semelhante à nossa.
Lá vai:
1. O presidente da República, com a força dos votos recentes, envia ao Congresso Nacional, no seu primeiro dia, o projeto de lei garantindo a autonomia formal do Banco Central. (veja no pé deste artigo um exemplo de BC independente). Livre de injunções político-partidárias, o BC estará em condições inéditas para se fixar no seu objetivo: manter a inflação na meta, com o máximo de crescimento econômico. Independente por força de lei, e não por concessão do presidente, que a pode retirar a qualquer momento, o BC não precisará provar a todo instante que age estritamente com base nos dados econômicos. Todo o debate que se trava hoje em torno da última decisão do BC ? se foi político-eleitoral ou técnica ? simplesmente não existiria. Com isso, como foi provado em outros países, a taxa básica de juros fixada pelo BC pode ser alguns mais baixa. BCs não autônomos precisam ser mais conservadores. Com a aprovação da autonomia legal, deve-se promover ao mesmo tempo uma redução escalonada da meta de inflação, dos atuais 4,5% para 2,5% ao ano.
2. No mesmo primeiro dia, o presidente envia ao Congresso um projeto de lei definindo uma redução dos gastos públicos pelos próximos oito anos. Não será preciso sair por ai demitindo funcionários e fechando repartições. Bastará estabelecer a regra pela qual o gasto do governo federal crescerá sempre abaixo da expansão do PIB. Assim, se o PIB cresce 5%, o gasto público só pode aumentar em 2%. Ao cabo de alguns anos, diminuirá o peso do Estado na economia, o que permitirá a redução da carga de impostos. Também levará a uma redução do endividamento público, para o que se deve estabelecer uma meta. Por exemplo, reduzir a dívida bruta dos atuais 60% do PIB para 40% em tantos anos.

Pode apostar. A simples aprovação dessas medidas pelo Congresso derrubará de maneira espetacular a taxa real de juros. Em pouco tempo, na medida em que os novos programas comecem a ser implantados, os juros brasileiros cairão paras os níveis internacionais. Em vez de uma taxa básica nominal de 10,75%, poderemos ter algo na casa dos 3 a 4% ao ano, em circunstâncias normais de crescimento.
A taxa de juros mais baixa, em ambiente de inflação também muito baixa e previsível, levará a um aumento extraordinário do crédito e uma elevação substancial do poder de compra das famílias. Logo, será necessário que esse movimento macroeconômico seja apoiado por uma onda de investimentos de modo a aumentar a produção e desenvolver a infraestrutura. Por exemplo, milhões de pessoas poderão viajar de avião, para o que será preciso construir mais aeroportos e suas malhas viárias de apoio.
Para detonar essa onda de investimentos não haverá alternativa senão um amplo programa de privatizações. É uma questão de dinheiro. Reparem: o governo federal destinou R$ 6 bilhões para a Infraero reformar os aeroportos. Não dá para nada. São Paulo, por exemplo, precisa de um novo aeroporto metropolitano ? e só isso já exigiria mais do que aqueles R$ 6 bilhões.
Assim, a alternativa é simples: ou os aeroportos são construídos e operados pela iniciativa privada, sob o regime de concessão, ou simplesmente não haverá aeroportos suficientes.
Isso vale para portos, rodovias e ferrovias, assim como para energia elétrica e telecomunicações.
Reparem: sem a expansão da infraestrutura, os preços dos serviços continuarão elevados. Com portos insuficientes, cai a concorrência e o exportador e o importador pagam mais pela circulação de suas mercadorias. Isso, de um lado, retira competitividade das exportações e aumenta preços internos.
Com mais aeroportos, as companhias poderão oferecer mais vôos, com aumento da concorrência e queda de preços ? como já aconteceu e acontece em tantos países. O Brasil é caro por falta de eficiência e de produção.
Além disso, será preciso uma onda de micro-reformas, de modo a facilitar a vida de quem quer abrir uma empresa e fazer negócios legalmente. Trata-se de derrubar a burocracia e também a carga tributária. Não faz sentido cobrar impostos pesados sobre o salário. Não faz sentido que o empreendedor pague um caminhão de impostos antes de faturar um único centavo. O custo de instalar uma fábrica sobe mais de 30% só por conta de impostos.
Para completar o bolo, umas boas mudanças no setor público, de modo melhorar a prestação dos serviços. Será preciso aumentar de maneira expressiva os salários de médicos, enfermeiros, professores e policiais, mas só desses e só daqueles que estiverem efetivamente trabalhando diretamente junto ao público. Professor na sala de aula tem de ganhar mais que assessor em Brasília. E, então, cobrar eficiência, medida com metas.
Há muitos outros projetos paralelos, mas o essencial está aí. De todo modo, este é, digamos, um programa aberto. Aceitam-se sugestões.

BC independente
Há um bem aqui ao lado, no Chile. A Constituição define as funções do banco, garantir a estabilidade monetária, e assegura sua autonomia técnica. A diretoria é formada por cinco membros, cada um com mandato de dez anos. Os diretores são designados pelo presidente da República, com aprovação do Senado. Detalhe crucial: os mandatos dos diretores não coincidem. Vence um a cada dois anos. Como o mandato de presidente da República é de quatro anos, sem reeleição, este nomeia apenas dois diretores do BC.
Os diretores podem ser demitidos? Podem, mas apenas mediante acusação e conseqüente processo na Corte de Apelações de Santiago, com motivos determinados.
O BC do Chile é dos mais eficientes do mundo. Na última reunião, julho, elevou a taxa básica de juros para 1,5% ao ano, com a inflação correndo no ritmo anual de 1,2%. A meta é de 3%.

Publicado em O Estado de S. Paulo, 09 de agosto de 2010

Deixe um comentário