O BRASIL FICOU MUITO CARO

—Onde perdemos competitividade?—

Por todo lugar onde passo, ouço histórias de indústrias brasileiras que perdem mercado para concorrentes chineses. Trata-se de uma dupla perda. De um lado, há companhias locais que não resistem à entrada dos produtos importados. Na outra ponta, e talvez seja o caso mais dramático, empresas exportadoras são deslocadas pelos chineses de mercados na América Latina, EUA e Europa.
São situações bem diferentes, a exigir respostas diferentes. No caso da concorrência dos importados, é até mais fácil. No limite, e sem discutir, por ora, o mérito dessa política, o governo brasileiro pode impor severas restrições à importação, combinando com medidas de favorecimento ao produto nacional. Como, aliás, já começa a fazer.
Mas como fazer para equilibrar a concorrência com os chineses no mercado de ônibus urbanos no Peru? Pode-se até conseguir alguma coisa via diplomacia — Hugo Chavez, por exemplo, a um dado momento, deu preferência a produtos e serviços brasileiros, como na construção de obras públicas. Mas está claro que isso é episódico. Governos estrangeiros, em regra, não vão conceder proteção às mercadorias brasileiras.
Que fazer? Executivos envolvidos nessas histórias têm suas explicações e propostas. O real valorizado e o yuan, moeda chinesa, desvalorizado são, claro, parte importante do problema. Mas tenho ouvido cada vez mais outras interpretações, que colocam a questão da competitividade geral das duas economias.
Os salários chineses, por exemplo. Já não são baixos, pelos menos não nos setores mais avançados, como eletrônicos, informática e tecnologia da comunicação ? contam executivos que lidam com essa concorrência. Dizem que os salários têm subido de maneira expressiva nos últimos anos e mesmo assim os produtos deles preservam preços competitivos no mundo todo.
Mas os impostos sobre a folha de salários fazem muita diferença. Ou seja, em diversos setores econômicos, o dinheiro que o trabalhador brasileiro leva para casa não é mais do que o obtido pelo chinês. A diferença efetiva está no imposto cobrado sobre a folha de salários, aqui algo como 35%, lá quase nada.
Na verdade, o peso dos impostos brasileiros fica cada vez mais evidente. Ouço frequentes relatos de executivos brasileiros que têm na ponta da língua a sequência infinita de impostos, taxas e contribuições que pagam desde o início da produção até colocar a mercadoria no navio.
Todo mundo sabe disso, a começar pelo governo. Tanto que todas as políticas industriais incluem como peça essencial a desoneração de impostos para setores e empresas. Mas não funciona, porque só podem ser beneficiados uns poucos escolhidos, uma vez que o governo continua precisando de arrecadação para financiar gastos crescentes. Este ou aquele setor ganha uma competitividade extra, e dependente das autoridades de plantão, mas o geral da economia continua pagando caro.
O outro problema cada vez mais evidente é o custo de capital ? a taxa de juros. A empresa brasileira se financia a juros muito, mas muito maiores que a chinesa. De novo, a política industrial concede financiamentos a juros baixinhos via BNDES. Mas poucos têm acesso a esse dinheiro barato. Quer dizer, barato para o tomador, mas caro para o governo que o subsidia.
Acrescente o custo da infra-estrutura ? a gente não faz um aeroporto novo há décadas, os chineses fizeram uma rede ? e se tem a história toda.
Nada disso é novo. O que me parece novo é o aparecimento frequente desse tema na bronca dos executivos. Antes, quase só se reclamava da taxa de câmbio. Hoje, fala-se mais do custo Brasil antes do câmbio.
Esta é a abordagem correta. Claro que um real bem desvalorizado ? a R$ 3,00 por dólar, digamos ? tornaria mais competitivos os produtos brasileiros lá fora. Mas provocaria uma forte inflação local, ao encarecer os importados e os produtos locais comercializáveis internacionalmente. Seria um novo tipo de custo Brasil.
Por outro lado, a proteção ao produto brasileiro no mercado brasileiro também vai encarecer o preço, sem representar ajuda para a exportação.
Eis o ponto: produzir no Brasil ficou muito caro ? pelos impostos e juros e pelo ambiente de negócios (custos burocráticos, de licenciamento etc) ? e não há mais real desvalorizado que resolva.
Bobeamos nisso. Há anos que a carga tributária aumenta todos os anos ? e isso tem passado quase sem oposição. Não digo que devemos importar os republicanos americanos, mas vamos reparar: a gente paga mais imposto que os americanos.
Há anos pagamos juros elevadíssimos e parece que está tudo bem. Até acreditamos quando nos dizem que sai em seis vezes no cartão sem juros. Ora, pessoal, essa autoenganação está passando do limite.
O que atrapalha o Brasil, o que impede o crescimento mais rápido, o que nos derrota na concorrência com os chineses, é o governo ? que arrecada demais, gasta demais e mal, e ainda por cima, deve muito, toma muito dinheiro emprestado, forçando os juros para a lua.

Publicado em O Estado de S. Paulo, 15 de agosto de 2011

Deixe um comentário