O ATAQUE AOS EUA E A REAÇÃO ECONÔMICA

. O mundo não acaba Jornalistas de rádio e televisão, que operavam ao vivo na última terça-feira, chegaram a pensar que estavam cobrindo o fim do mundo. Correram para os estúdios para relatar e mostrar o que parecia ser um acidente – um avião desgovernado atingindo uma das torres do World Trade Center. Daí em diante, a vertiginosa sequência: a segunda torre atingida, um terceiro avião lançado contra o Pentágono, oito jatos sequestrados ainda voam nos Estados Unidos, sinais de incêndio na Casa Branca, bomba no prédido do Congresso em Washington, explosões de shoppings centers em diversas cidades, o presidente George Bush escondido em alguma base aérea, as torres do Trade Center desabam, há sinais de explosões em outros prédios de centro financeiro de Nova York, milhares de pessoas correm pelas ruas em meio a nuvens de fumaça e cinzas … Isso tudo em uma hora e meia, notícias e imagens entrando na velocidade da era on-line. Não se viu nem se ouviu menção a bombas atômicas, é verdade, mas se aquilo não era o começo de algo parecido com o fim do mundo, o que seria? Algumas horas se passaram e já havia mais jornalistas nos estúdios e nas redações, de modo que o trabalho de checagem tornou-se mais apurado. Aos poucos, começou-se a distinguir notícia de percepções e impressões veiculadas pelo pânico. No fim da tarde, a real dimensão do episódio estava definida: as duas torres destruídas e mais os prédios em volta, parte do Pentágono arrasada, um quatro avião sequestrado que havia caído, milhares de mortos. Tratava-se do maior ataque terrorista da história, o primeiro episódio de guerra do século 21, um dia de pavor e medo que se espalharam de Nova York e Washington para o mundo todo. Globalização, a propósito. Mas, definitivamente, não era o fim do mundo, nem se havia iniciado uma guerra mundial. Foi um alívio, se é que se pode falar assim numa hora dessas. Mesmo porque muitas inquietações permanecem no ar: quem são os terroristas? Qual o tamanho da rede? Serão capazes de novas ações imediatas? Qual a reação dos Estados Unidos? Agirão isoladamente ou buscarão entendimento com os aliados? Atacarão movidos pela justa raiva ou serão movidos pela razão e pela prudência? E, finalmente, o que acontecerá com a economia mundial? A primeira reação dos operadores do mercado financeiro equivale aos primeiros momentos dos jornalistas nos estúdios no 11 de setembro: é o fim do mundo. No caso, despenca o valor das ações, vale dizer, despenca o valor das empresas, por se entender que, em guerra anti-terror, os consumidores, amedrontados, gastam menos, os investidores, idem, aplicam menos, o mundo cai numa recessão, todos se empobrecem. Acresce que o conflito envolve centros produtores de petróleo, disparam os preços, etc. etc. Há razões objetivas para inquietação nesse sentido, especialmente porque, antes do ataque, o mundo já resvalava na recessão. Nos Estados Unidos, por exemplo, a confiança do consumidor estava em queda antes do 11 de setembro e isso por causa do aumento do desemprego. Considere que o consumo das famílias representa quase 70% do Produto Interno Bruto dos EUA. Considere que o PIB americano representa mais de 30% do produto mundial e se conclui que a ida dos americanos ao shopping movimenta mais de 20% dos negócios em todo o mundo. Acrescente que o consumidor americano retraído influencia os demais – e, bem, há razões para se temer uma recessão. Mas, como os jornalistas já na noite de 11 de setembro, convém deixar passar o pânico e se concentrar nas notícias. Por exemplo: os bancos centrais dos EUA, Europa e Japão coordenaram suas ações já no day after, de modo a injetar dinheiro barato no mercado para que bancos e demais institutições possam cumprir seus compromissos. Diretores dos BCs garantem que estão prontos para combater ameaças de recessão e de crises financeiras. Há sinais de que o Fed, o banco central americano, vai reduzir os juros. Não é só conversa. Lembrem-se de 1998, quando o mundo esteve à beira de uma severa depressão em seguida às crises financeiras. Liderados por Alan Greenspan, o presidente do Fed, os BCs e as autoridades econômicas agiram com acerto e a tempo e conseguiram bloquear a crise. Já em 1999, se retomava o crescimento. Depois veio o estouro da bolha das ações da Nova Economia, mas isso é outra história, é coisa do capitalismo, não de terroristas. O ponto é o seguinte: as previsões de catástrofe partem de um equívoco essencial, a sensação de que o mundo está sem comando, quer o mundo político, quer o econômico. Comando no caso não se refere apenas aos governantes, as lideranças políticas, mas a todos que de algum modo inteferem nos acontecimentos. Isso inclui desde a dona de casa que decide gastar mais ou menos, até o executivo de empresa que investe ou coloca todo seu dinheiro no cofre. Ora, excetuando os terroristas e seus aliados, ninguém quer o pior, de modo que o mais razoável é supor que as pessoas encontrarão meios de reagir – como encontraram com frequência no passado. Sim, George Bush não é Bill Clinton, cuja ação internacional na economia e na política revelou-se eficiente e positiva. O vacilo de Bush nos primeiros momentos, escondendo-se em vez de ir para Washington e assumir o comando, foi um péssimo sinal. Mas lá está Tony Blair com sua visão internacionalista e liderança firme, inteligente e moderada. Entre os executivos e investidores, já se fala em acordo de cavalheiros para evitar um inútil derramamento de sangue na reabertura das bolsas americanas. Na sexta passada, uma grande empresa, a Cisco, anunciou que, para manifestar sua confiança, vai recomprar suas ações, impondo assim um limite à desvalorização. Os consumidores americanos foram às lojas comprar bandeiras de seu país. Também compraram armas, uma atitude irracional, mas de qualquer modo aquece um tipo de negócios. Já se fala em reconstrução do centro financeiro, mais gastos públicos, portanto. Uma depressão mundial seria um triunfo do terrorismo. Assim como se vai reagir política e psicologicamente, também é de esperar que aja uma boa resposta na economia. Bem pode surgir um ambiente do tipo “não vamos nos deixar abater” – e confiança, o senhor e a senhora sabem, é tudo na economia e na vida. (Publicado em O Estado de S.Paulo, 17/09/2001)

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