NÃO TEM NADA DE MAIS

Lançada a teoria Aldo Rebelo: o atraso é nosso!

O ministro Aldo Rebelo, dos Esportes, traz preciosa contribuição para nossa série ?Não tem nada de mais?. Perguntado sobre o atraso nas obras da Copa, disse que não tem problema algum. Explicou: ?é uma coisa de nossa cultura?. Detalhou: ?o brasileiro tem um jeito próprio de organizar e sempre entrega o que precisa?.
Entrega quando? E a que preço?
No mesmo dia em que saiu a teoria do ministro, este Estadão, em preciosa reportagem de Marta Salomon, trouxe um exemplo da sua aplicação prática – as obras de transposição do rio São Francisco.
Lula iniciou o programa em 2007, com diversos comícios, prometendo entregar ?a maior obra? de seu governo em 2010, último ano de seu mandato. Por R$ 4,8 bilhões, já então a meta mais cara do PAC.
E tudo funcionou perfeitamente de acordo com a teoria Rebelo: a coisa está muito atrasada. Segundo estimativas atuais, só fica pronta em 2016, seis anos depois do primeiro prazo.
Não tem nada de mais, é da nossa cultura.
O preço já saltou para R$ 8,2 bilhões, conforme a última revisão, feita recentemente pelo governo Dilma. Não tem nada de mais, é o jeito brasileiro de fazer.
Segundo revela a reportagem, o aumento do prazo e do custo vem de um vício de origem. As obras começaram de forma apressada, a partir de óbvio interesse político. Projetos de engenharia mal feitos e incompletos estão sendo revistos, licitações refeitas ? e assim vai. Jeito brasileiro: manda bala, depois a gente vê como fica.
Seis anos de atraso, R$ 3,4 bilhões de custo adicional, qual o problema? Considerando que a teoria do ministro é intemporal, é claro que pode atrasar mais e ficar ainda mais caro.
A diferença em relação à Copa é que os jogos têm data e horário marcado para começar. Acaba saindo, mas tudo incompleto, improvisado e, claro, mais caro.
Só faltava essa: o atraso é nosso!

Custo Kassab
A prefeitura de São Paulo acaba de dar contribuição exemplar ao incremento do custo Brasil. Aplicou um aumento de carga tributária e, ao mesmo tempo, complicou a vida do contribuinte.
A pesquisa ?Fazendo Negócios?, do Banco Mundial, diz que o sistema tributário brasileiro é simplesmente o pior do mundo. As pessoas e empresas aqui não apenas pagam impostos excessivos, como são obrigadas a uma penosa (e custosa) burocracia para manter em dia as contas com as Receitas federal, estadual e municipal.
A prefeitura paulistana caprichou nos dois quesitos. Semana passada, médicos, dentistas e veterinários receberam, muitos em suas residências, um boleto para pagamento de uma taxa de lixo hospitalar, a Taxa de Resíduos Sólidos de Serviços de Saúde – TRSS, ?nos termos da Lei 13.478/2002?.
Repararam na data da lei? Pois é, na gestão de Marta Suplicy, que foi atacada justamente pela ?sanha tributária?, na campanha de 2004, pela dupla Serra/Kassab, candidatos a prefeito e vice. Lembram-se da ?Martaxa??
Pois Serra ganhou e cancelou a cobrança, mas a lei ficou lá. Passa o tempo e o prefeito Kassab volta com a taxa. E com que método?
Ao que parece, a prefeitura mandou o boleto para todos os médicos, dentistas e veterinários cujos nomes estavam em seus arquivos. Levantamos o caso na rádio CBN e recebemos inúmeros emails de profissionais que receberam a cobrança, em casa, mesmo não tendo clínica ou tendo clínica de consultas e simples atendimento, sem procedimentos que gerem volume de lixo hospitalar.
Mas o mais sensacional vem a seguir. A prefeitura, pela Secretaria de Finanças, informou que o contribuinte podia reclamar e pedir a isenção. Como?
Eis as instruções: ?Se você não é contribuinte obrigatório da TRSS, nos termos da Lei 13.478/2002, poderá protocolar uma reclamação tributária na Praça de Atendimento localizada no Vale do Anhangabaú 206, solicitando a exclusão do código da TRSS e anexando: os documentos que comprovem não ser gerador de resíduos sólidos de serviços de saúde Ficha de Dados Cadastrais ? FDC emitida via Internet CNPJ do estabelecimento, atualizado e dentro do prazo de validade Instrumento de Constituição (Contrato Social, Declaração de Firma Individual, Estatuto, Ata…) e, se for do caso, suas alterações posteriores, regulamente registradas no órgão competente RG e CPF do Signatário Registro no Órgão de Classe Fiscalizador quando o pedido for apresentado por procurador, deve ser anexada a procuração, com firma reconhecida acompanhada do RG e CPF do procurador outros documentos pertinentes ao caso. O processo será encaminhado para a fiscalização de LIMPUR e, procedente a reclamação, a cobrança da TRSS será cancelada. Se a reclamação não proceder, a taxa será mantida e cobrada com os acréscimos legais?.
Que tal? Manda a cobrança para todo mundo e avisa que quem estiver fora, pode reclamar. Algo do tipo: cobra, se colar, colou.
Por via das dúvidas, o governo cria uma enorme dificuldade para a pessoa reclamar, certamente na expectativa de que muitos vão deixar por isso mesmo e pagar os R$ 177,30. Fica mais caro a perda de tempo e de dinheiro com a burocracia da reclamação.
O sistema e os métodos tributários brasileiros são piores do que diz o Banco Mundial.

Publicado em O Estado de S. Paulo, 26 de março de 2012

Deixe um comentário