MANDEM A CONTA PARA LULA

O ex-presidente atrasou as privatizações e, pois, os investimentos em aeroportos

Há um interessante debate sobre a privatização dos aeroportos feita pelo governo Dilma, mas há também o entendimento de que a mudança é positiva. E desde já, se a coisa funcionar mais ou menos, fica assim: o governo ganha dinheiro com os aeroportos, ao vender as concessões (R$ 26 bilhões numa tacada inicial!) e receber participação nos lucros e ainda consegue turbinar os investimentos nessa área crucial de infra-estrutura. Ou seja, se tivesse feito isso há mais tempo, o governo poderia ter utilizado em outros setores carentes, saúde, por exemplo, o dinheiro que gastou em aeroportos e o que teria recebido nas privatizações. E o público estaria mais bem servido. Por que não se fez antes? Porque o então presidente Lula não deixou.
A conversa sobre privatização dos aeroportos não é nova, sobretudo no mundo privado. No governo FHC, tratou-se disso no segundo mandato, quando o presidente já estava desgastado e privatizar era pior do que qualquer outra coisa. Em suas duas campanhas vitoriosas, Lula voltou a demonizar a privatização, com tal força que os próprios tucanos fugiram dela como diabo da cruz. Mas no segundo governo Lula, a partir de 2007, o tema voltou, quando a administração lidava com o caos aéreo que explodira no final de 2006.
Foi quando as autoridades finalmente admitiram que todo o sistema aéreo era, literalmente, uma permanente ameaça de desastre: recursos mal administrados os aeroportos sem estrutura adequada falta de pessoal especializado, como os controladores de tráfego aéreo radares com zonas cegas falhas nas comunicações por rádio.
Feitas as contas, estava na cara que os recursos necessários para atacar todos esses problemas estavam muito acima da capacidade do governo federal. Conclusão óbvia: era preciso trazer dinheiro, empresas e gente nova para o setor. Vender concessões era a óbvia saída.
Pelo menos três ministros do governo Lula disseram a este colunista que a privatização era inevitável. A necessidade venceria as resistências ideológicas. Modelos foram analisados pelos técnicos da administração federal, alguns chegaram a ser anunciados.
Por exemplo: em julho de 2007, o então ministro da Defesa, Nelson Jobim, deu prazo de 90 dias para que a Agência Nacional de Aviação Civil, Anac, e a Infraero apresentassem o projeto para o terceiro aeroporto de São Paulo.
Ficou pelo caminho. A coisa simplesmente morreu, não se falou mais nisso. Já havia então um projeto preparado por um grupo de empresas privadas para a construção desse aeroporto na região de Araucaria. Aliás, o projeto continua de pé, e voltou a ser lembrado agora que o governo fez três concessões privadas de aeroportos já existentes. Por que não autorizar a construção de um outro, inteiramente e desde o início privado?
Resumindo: a presidente Dilma e seu pessoal celebraram os leilões de Guarulhos, Viracopos e Brasília. Disseram, corretamente, que se inicia uma nova era, com mais investimentos e mais eficiência. Por que não fizeram antes se todos estavam no governo Lula?
Porque Lula disse que tudo se resolveria com o PAC, no qual destinou uns R$ 5 bilhões à Infraero, para os 12 aeroportos da Copa. Reparem como não fazia sentido além da propaganda. Só para a privatização de Guarulhos, o governo exigiu da nova concessionária compromisso de investimentos de … R$ 5 bilhões. Para Brasília, mais de R$ 8 bilhões.
Resumo da ópera: Lula é responsável por um atraso de cinco anos nessa privatização.
Greve de policiais
Tem ainda uma outra conta para o ex-presidente, a falta de legislação regulando greves de funcionários e de policiais, como essa que assombra a Bahia.
Entre o final de 2006 e o início de 2007, houve uma sequência de greves de servidores públicos da educação, previdência, meio ambiente e também da polícia. O impacto foi tão negativo que até o presidente Lula reclamou. Lembram-se? Disse que funcionário público em greve parecia, na verdade, estar em férias, pois não tinha desconto dos dias parados.
Encarregou o então ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, de preparar um projeto regulamentando o tema. O ministro chegou a anunciar os princípios da nova legislação. Por exemplo: servidor armado não pode fazer greve greves têm de ser aprovadas em assembléias com pelo menos dois terços da categoria (a greve dos PMs da Bahia seria ilegal nos dois quesitos) e servidor em greve não recebe salário.
Onde está o projeto? Sumiu. Os sindicatos de funcionários não gostaram, Lula esqueceu.
É sempre difícil saber como as coisas teriam se passado se outras providências tivessem sido tomadas. Mas o olhar em retrospectiva mostra, sim, o que deixou de ser feito.

Publicado em O Globo, 09 de fevereiro de 2012

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