EUA MAIS DEVAGAR – BOM PARA TODOS

. Com os números sobre construção de casa própria, divulgados na sexta, 16, a semana terminou com um placar amplamente favorável à tese segundo a qual a economia americana está em desaceleração e que isso é consequência da política de alta de juros aplicada pelo banco central dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed).
Indicadores econômicos não oferecem leitura fácil. Quando se abrem os números, as mensagem podem ser contraditórias, mas com uma simples olhada nas duas tabelas abaixo verifica-se a supremacia dos sinais de desaceleração.
A conclusão é que o consumidor americano continua gastando, porém um pouco menos. E isso é bom lá para eles e aqui para nós.
Para eles, porque a continuar assim a economia americana poderá crescer neste ano sem ameaça de inflação, isto é, sem que a demanda de empresas e consumidores supere a capacidade de produção.
Para nós, porque, confirmada a desaceleração, o Fed poderá logo sustar a alta de juros ? e isso elimina o principal fator de instabilidade nos mercados financeiros internacionais. Em termos mais simples: estabilizados os juros internacionais, os juros brasileiros podem cair.
Eis porque a situação americana nos interessa tanto. Confira a tabela e acompanhe os comentários:
Estados Unidos ? Sinais de desaceleração
  Maio Abril Março Desemprego 4,1% 3,9% 4,1% Empregos criados 231 mil 340 mil 458 mil Aumento salário/hora 0,1% 0,4% 0,3% Inflação ao consumidor 0,1% 0 0,7% Inflação ao consumidor (núcleo) 0,2% 0,2% 0,4% Preços no atacado 0 -0,3% 1% Preços no atacado ? núcleo 0,2% 0,1% 0,1% Estoques da indústria   0,4% 0,3% Vendas indústria/varejo   -0,6% 1,2% Salário real médio -0,3% 0,7%   Vendas varejo- Índice geral -0,3% -0,6%   Varejo?grandes volumes -1%     Não duráveis 0,2%     Obras imóveis residenciais iniciadas ? variação -3,9%
    Obras imóveis residenciais iniciadas ? média anualizada 1,59 milhão 1,65 milhão 1.61 milhão Autorização p/construção novas residências ? variação -4,3%     Autorização p/construção novas residências ? média anualizada 1,49 milhão 1,57 milhão   Sinais de aceleração
  Maio Abril Março Produção industrial 0,4% 0,7% 0,7% Manufaturas 0,3% 0,6%   Bens duráveis 0,7% 1,1%   Não duráveis -0,2% 0   Utiilização capacidade 82,1% 82,1%   Pedidos auxílio desemprego – 16 mil     CASA PRÓPRIA ? O sinal mais eloquente de desaceleração está no item construção de novas residências. É um mercado totalmente dependente das taxas de juros, já que, convém lembrar, em países estáveis a regra é comprar casa com financiamento de 30 anos.
Em maio, os juros para financiamento imobiliário, no sistema de hipotecas, o mais utilizado, chegaram a 8,52% ao ano (contra 8,1% em abril). Isso é quase três pontos acima do nível do início do ano passado, antes do Fed iniciar a escalada que levou a taxa básica juros de 4,75% para os atuais 6,5% ao ano.
Em maio, caíram tanto o início efetivo de novas obras quanto as autorizações concedidas pelas prefeituras. Este último indicador mostra o mercado futuro.
Os diretores do Fed têm dito que uma das causas do aquecimento exagerado é que o consumidor está gastando por conta. Ou seja, está comprando hoje com uma renda que espera ganhar no futuro, inclusive com a valorização de ações ou de seus imóveis.
Os sinais de mercado imobiliário de casa própria indicam arrefecimento desse ímpeto. De todo modo, registre-se o vigor: ainda que menos animadas, as famílias estão iniciando 1,6 milhão de casas por ano.
E aqui para nós: a taxa de juros elevada é de 8,52% ao ano!!!
VAREJÃO ? Nas vendas do varejo, há quedas nos ramos de automóveis, material de construção e duráveis de grande volume e mais caros (geladeiras, por exemplo). Ou seja, diminuem as vendas de tudo que depende de crediário.
Isso altera a interpretação sobre os sinais de aceleração referentes à produção industrial em maio. Desagregados os números, cresceu a produção nas indústrias de alta tecnologia, equipamentos para empresas e serviços públicos (energia elétrica e saneamento).
Caiu a produção na indústria relacionada a casas e carros. A produção de automóveis caiu 0,2% e a de eletrodomésticos grandes e de eletroeletrônicos residenciais, 0,1%.
Ora, o consumo privado é responsável por quase dois terços da atividade econômica nos EUA. Só para dar uma idéia parcial: as vendas do varejo em maio, desaceleradas, foram de US$ 266 bilhões. Eles "gastam" nos shopping uma Argentina por mês!
Assim, a produção industrial de maio mostra uma desaceleração nos produtos ao consumidor e uma aceleração nos serviços de infra-estrutura e no ramo de bens de capital. Isso pode não ser ruim, já que significa investimentos que levam a ganhos de produtividade nas empresas.
Por outro lado, o aumento dos estoques da indústria foi interpretado como sinal de desaceleração. Vendendo menos ao comércio, sobra mais no estoque. Mas poderia ser encomenda maior?
PREÇOS – Aqui estão os sinais mais controvertidos. Os números básicos mostram estabilidade, especialmente no caso do índice de preços ao consumidor, que havia causado pânico nos mercados com a alta de 0,7% em março.
(Lembre-se: foi em março que o mercado começou a derrubar bolsas e aumentar juros. Reflexos no Brasil: os juros no mercado privado foram de 17,5% ao ano em março para 20,5% em maio. Estão agora em 19,5%, já refletindo a calmaria com a sensação de desaceleração nos EUA).
Mas diversos especialistas mostraram que, desagregando os índices de preços, verifica-se que a inflação americana, na média anualizada, está perto de 2% – que é o teto informal do Fed ? enquanto andava em torno do 1% há um ano.
SALÁRIO E EMPREGO ? Os números mostram desaceleração na criação de empregos e estabilidade nos salários. Entretanto, nota um relatório do Fed conhecido como o Livro Bege, que dá uma geral na economia, os salários de empregos temporários continuam em alta acelerada.
O ponto aqui é clássico. Se as empresas passam a disputar trabalhadores, os salários tendem a subir mais que os ganhos de produtividade e essa elevação de custos passa aos preços, iniciando a espiral inflacionária.
Em tempo; o relatório do Fed registra que o desemprego não cai mais graças à entrada no mercado de imigrantes e jovens. Ou seja, continua em funcionamento a poderosa fábrica de empregos.
NO CRAVO E NA FERRADURA ? O Livro Bege diz que o Fed registrou sinais de desaceleração em 11 dos 12 distritos regionais do banco. Mas o consumo privado, motor da economia, está em desaceleração clara em apenas seis distritos.
Daí que diretores do Fed têm dito que, sim, há sinais de arrefecimento, mas não são conclusivos. Mesmo porque há também sinais de inflação.
Em resumo: parece que há desaceleração, mas seguro morreu de velho.
O Fed reúne-se no próximo dia 28 para decidir sobre a taxa de juros. Até duas semanas atrás, a maioria apostava que haveria uma elevação de 6,5% para 7%.
Hoje, as apostas se dividem entre alta para 6,75% ou manutenção dos 6,.5%.
Ainda há muitos indicadores a observar nos próximos dez dias.
BRASIL ? O Banco Central brasileiro suspendeu a redução de juros basicamente por causa de dois fatores externos: a situação americana e o preço do petróleo. O primeiro fator parece em vias de solução. Já o petróleo continua em alta.
Uma pela outra, os juros podem voltar a cair por aqui, já que a inflação interna é menor que a esperada. A expectativa de inflação para o ano também caiu, mesmo incluindo mais um aumento da gasolina.
O problema é que o BC brasileiro reúne-se para fixar os juros locais no próximo dia 21, uma semana antes do Fed e um dia antes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo, que vai decidir sobre o preço do óleo.
A maioria por aqui está achando que o BC pode subir no muro no dia 21 e deixar tudo pronto para derrubar os juros assim que Opep e Fed dêem sinais positivos.
(Para a relação entre a situação nos EUA e petróleo e o Brasil, veja no Arquivo, nas seções Em Cima dos Fatos (notas da última semana) e Entenda a Economia).

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