ECONOMIA EXPLICA A CRIMINALIDADE

. A Economia do crime A Economia e a Física são as ciências que mais evoluiram nos últimos tempos. Normal, portanto, que estendam seus domínios. Assim como a Física parece filosofia (metafísica ou ciência universal) quando examina as origens e o futuro do universo, a Economia amplia seu olhar para toda a atividade humana, além da econômica propriamente dita. De certo modo, pode-se dizer que toda atividade humana é econômica, de tal modo que a Economia seria a ciência humana universal, mas isso é outra história. Por hoje, bem mais modestamente, interessam os estudos da criminalidade pelo prisma da teoria econômica. Há resultados muito interessantes. Por exemplo, estabelecendo-se relações entre índices de pobreza e criminalidade, verifica-se aí que a correlação é praticamente nula. Ou seja, não é a pobreza que causa a criminalidade. Há países pobres com menos crimes do que em outros mais ricos. Do mesmo modo, foi possível medir aumento de criminalidade em momentos de forte crescimento econômico e inversamente. Os estudos internacionais também registraram pouca relação de causa e efeito entre desigualdade de renda e criminalidade. Mas isso para países normais, “não para o Brasil onde a desigualdade é patológica”, nota o economista e professor Carlos da Costa, coordenador das Faculdades Ibmec. Costa montou algumas séries segundo as quais uma redução substancial da desigualdade de renda no Brasil levaria, sim, a uma redução da criminalidade. Ao contrário do que acontece em situações normais, como Estados Unidos ou França ou Itália, onde variações da desigualdade não correspondem a variações na criminalidade. O que vale para todos países é uma forte relação entre repressão eficaz e crime. Quanto maior uma, menor o outro. Reparem: fala-se de “maior” e “menor”, não de melhor ou pior no caso da repressão. Ou seja, é preciso medir, assim exige a ciência econômica. Parece fácil medir o crime – bastaria apanhar os registros policiais. Mas não é simples, pois muitas pessoas não informam à polícia os crimes de que foram vítimas – fato tanto mais frequente quanto menor a confiança na polícia. Mas como se mede a quantidade de crimes que não é relatada? Aqui é preciso recorrer a um modelo de pesquisa desenvolvido pelas Nações Unidas, informa Carlos da Costa. O pesquisador vai às casas das pessoas e faz as perguntas. E assim se mede o número de crimes. Parece mais difícil medir repressão eficaz, mas há caminhos. Por exemplo, o número de crimes esclarecidos em relação aos cometidos; o número de criminosos presos, condenados e que ficam na prisão (ou seja, deve-se contar também o número de fugas); o número de anos em que o criminoso fica preso; a rapidez ou a demora no julgamento e execução da pena. Ou seja, há muitos números que, combinados, permitem compor uma boa medida do que seja repressão eficaz. Comparando com o número de crimes, a relação surge nítida para todos os países, todas as situações: quanto mais crimes esclarecidos e criminosos presos a tempo, que permaneçam presos, menos crimes cometidos. Trata-se de risco e oportunidade. O sujeito estará mais propenso ao crime quanto menor for o risco dele ser apanhado e punido. Parece óbvio, mas o importante aqui é que essa relação foi medida e comprovada em diversas situações concretas. Há muitos outros dados relevantes, como a composição da população. Quanto mais rapazes entre 18 e 28 anos, por exemplo, mais crimes. Mas a relação mais significativa e, sobretudo, aquela sobre a qual se pode intervir diretamente é a determinada pela repressão eficaz. (Atenção: trata-se de polícia e judiciário eficientes, não sair por aí dando tiros, torturando e prendendo sem mandado judicial). Outro ponto muito importante: a história de casos concretos mostra que os efeitos de uma repressão eficaz são quase imediatos. O número de crimes cai sensivelmente tão logo se coloca em ação uma boa polícia e um sistema de punições competente. Isso traz esperança por aqui. O Brasil não é pioneiro nisso: polícia incompetente, corrupta e dominada pelo crime organizado acontece e já aconteceu em toda parte. Mas o outro lado também acontece: mudanças radicais no aparelho policial e judiciário, operadas por governos competentes em tempo relativamente curto. Esse, portanto, deve ser o foco imediato de uma política de segurança no país. Claro que sempre se deve agir contra a desigualdade de renda, por exemplo, mas a experiência mostra que os resultados nesse campo ocorrem a médio e longo prazo.Ou seja, combater a pobreza e a desigualdade não é política de segurança. É política para sempre, que terá efeitos sobre a criminalidade. Já as ações com foco direto – construção de uma repressão eficaz e redução de oportunidades (estímulos) para se cometer o crime – podem ser desfechadas imediatamente, produzindo resultados em poucos meses. Publicado em O Estado de S.Paulo, 28/01/2002

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