CUSTO BRASIL NA VEIA

. Dá-lhe custo Brasil      
A inflação de 2005, medida pelo IPCA, ficou um pouco acima da meta do Banco Central, mas o resultado é claramente positivo. O número final, 5,7%, é uma redução de dois pontos percentuais em relação a 2004, está dentro da margem de tolerância e aproxima o Brasil dos países emergentes com boas condições macroeconômicas. Uma dessas condições, pelo padrão internacional, é inflação inferior a 5% ao ano. Estamos quase lá, portanto.     
Também há melhoras em outros fatores macro. Por exemplo, a relação entre dívida externa total e exportações caiu para algo em torno de 1,5 (ou seja, um ano e meio de exportações para ?matar? toda a dívida). Também estamos chegando lá. A relação ideal é de menos de 1.     
Caiu a relação entre Dívida Líquida do Setor Pública (DLSP) e o Produto Interno Bruto (PIB), mas nesse quesito o Brasil está mais longe do padrão. A relação deve ficar no máximo em 40% e estamos ainda na casa dos 50%.     
Já a carga tributária deve ter aumentado, o que é grave para um país que já apresentava um número superior ao da média dos emergentes. Brasileiros pagam 37 reais de impostos por cada 100 reais gerados. Deveriam pagar no máximo, estourando, 30 reais, para ficar ao lado dos que mais pagam. Uma pela outra, porém, as condições macro melhoraram em 2005. O problema é que a microeconomia também importa. É possível que um país tenha inflação e dívida baixas e, mesmo assim, apresente baixa capacidade de crescimento econômico. Basta que o ambiente institucional seja hostil aos negócios privados.     
Essa relação entre instituições e crescimento econômico é tema de estudos não tão recentes, mas que só agora começam a receber atenção mais cuidadosa por aqui. Estamos atrasados. Séculos de cultura e ideologia estatizante resultaram numa visão que desconfia de todo aquele que quer empreender e ganhar dinheiro. E como todo empreendedor é suspeito, resulta daí um ambiente que dificulta os negócios privados, pois se impõem regras e restrições para ?proteger? a sociedade da sanha dos capitalistas. O Banco Mundial mede os estragos. Sua pesquisa ?Fazendo negócios? compara o ambiente dos diversos países a partir de indicadores simples. Por exemplo: tempo e procedimentos necessários para abrir uma empresa, dias para resolver uma pendência comercial na justiça, custo de demissão, percentagem de crédito recuperado em falências, e por aí vai. O Brasil vai muito mal nessa pesquisa. E isso é uma restrição real ao crescimento. O ministro do Desenvolvimento, Luis Fernando Furlan, que compra essa tese, colocou entre suas tarefas a de simplificar e liberalizar o sistema de comércio exterior. Tem conseguido bons resultados, mas o espírito regulatório é tão forte por aqui que a burocracia vira-e-mexe consegue bloquear a abertura.     
O leitor Alfredo A. Schnabel Fuentes, executivo da filial brasileira de uma multinacional alemã do ramo de sensores, tem uma história exemplar, no mau sentido. Eis o que ele nos contou, em resumo, em email enviado na semana passada:      
?A multinacional fabrica na Alemanha sensores de última geração para automação de linhas de produção. A filial  importa e distribui para todo o Brasil. Por escolha da matriz, todas as exportações são feitas na moeda do país de destino, ou seja, os alemães querem vender ao Brasil em Reais e não em Euros. Para nós brasileiros, isso seria ótimo pois deixaríamos de dever em moeda estrangeira e todo o risco cambial ficaria com o exportador. O governo deveria até estimular este tipo de operação … Certo ?… Errado! Desde 1999 tentamos viabilizar esta operação e nos deparamos sempre com grandes dificuldades de procedimentos: as importações eram feitas sem cobertura cambial, o pagamento em Reais tinha que ser feito através de uma operação triangular, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) tinha que emitir uma Licença de Importação (LI) antes do embarque da mercadoria, etc,etc. Ou seja para comprar em Euros, tudo bem, quando aparece um "louco" querendo vender em Reais , tudo é difícil. Em 2005, finalmente, o Banco Central editou uma nova norma que equiparava as importações em Reais às feitas em outras moedas. Ou seja, podemos importar em Reais e, no momento do pagamento, fechamos o câmbio e enviamos o equivalente em Euros para a nossa matriz. Como estas importações passam a ser "com cobertura cambial", o MDIC não pleiteava a necessidade de emissão de LI prévia. Em maio de 2005, fizemos uma importação teste que funcionou perfeitamente, sem LI, sem burocracia, tudo normal. Renegociamos com nossa matriz toda a lista de preços para operarmos este ano em Reais. No primeiro embarque, a surpresa: o MDIC editou uma nova portaria pela qual as importações em moeda nacional passam a ser objeto de uma Licença de Importação (LI) prévia. Ou seja, o Banco Central abriu de um lado e o Ministério do Desenvolvimento fechou de outro. Agora pergunto: o MDIC não deveria ficar satisfeito com esta importação de sensores de última geração em moeda nacional? Qual a justificativa de meu concorrente importar dos EUA em dólares e desembaraçar seu produto com muito menos burocracia do que eu que importo da Alemanha em Reais??   O que é que eu digo? Na semana passada, nosso leitor mandou mensagem ao MDIC, mostrando a contradição entre o BC e o Ministério. Algo desanimado quanto ao efeito dessa reclamação, o leitor conclui assim seu email: ?Agora eu tenho que explicar para minha matriz que o que funcionou em maio… não funciona mais hoje…Dá-lhe custo Brasil?.  Publicado em O Estado de S.Paulo, 16/janeiro/2006

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