Quando deixou a presidência do Conselho de Administração da Petrobrás, em março de 2010, Dilma Rousseff disse que se sentia muito feliz, orgulhosa e grata pelo aprendizado. “Você tem uma nova visão de Brasil, vê a riqueza do Brasil” – afirmou.
Estava, pois, num posto privilegiado, onde ficou sete anos. E como não viu os desastres cometidos na gestão da empresa? Porque não foi apenas roubalheira. A Petrobrás foi também destruída por uma administração no mínimo temerária, que deixou prejuízos bilionários para a companhia.
Eis dois exemplos bem atuais. Na última terça, a Petrobrás foi condenada no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) a pagar impostos e multas no valor de R$ 7,3 bilhões. O Carf considerou irregulares duas operações feitas em 2007 e 2008, nas quais a companhia colocou como despesa operacional os aportes de R$ 6 bilhões que fizera para o Petros, fundo de pensão dos funcionários. A despesa operacional abate do resultado e, pois, reduz o imposto a pagar.
Dirão: mas é uma questão de contabilidade, não passa pelo Conselho de Administração.
Errado. Essa manobra – bilionária – aparece no balanço e tem de chamar a atenção do Conselho, pelo menos de um Conselho minimamente atento.
Outra: na mesma terça passada, o ValorPro, serviço de informação on line do jornal Valor Econômico, informou que a Petrobrás obteve um prejuízo de US$ 1,95 bilhão na compra da refinaria de Okinawa, no Japão, efetuada em 2008. O jornal teve acesso a um relatório da própria companhia. A refinaria foi fechada, por inútil, no ano passado. Está à venda, mas não apareceram compradores.
A compra se deu dois anos depois da aquisição da refinaria de Pasadena, nos EUA — isso mesmo, aquela que deu um prejuízo do mesmo tamanho, sem contar a roubalheira.
Para os dois negócios desastrosos, Dilma Rousseff, já como presidente da República, deu a mesma explicação. O Conselho havia autorizado as compras com base em resumos executivos oferecidos pela diretoria.
Dois resuminhos e tudo bem?
A reportagem do ValorPro, assinada por Claudia Schufnner, jornalista de reconhecida competência nessa área, conta que a compra de Okinawa foi intensamente debatida por quadros técnicos da estatal, muitos levantando dúvidas e restrições. Não devem ter aparecido nos resuminhos.
Quem começou o negócio de Okinawa foi Nestor Cerveró. Quer fechou foi Jorge Zelada, ambos apanhados pela Lava Jato. Assim como os envolvidos com Pasadena, Paulo Roberto Costa e Renato Duque.
Foi também durante o período de Dilma no Conselho de Administração que a Petrobrás decidiu construir quatro refinarias, as de Pernambuco (Abreu e Lima), do Rio (Comperj) e as duas “premium” do Maranhão e Ceará. Estas últimas foram canceladas no ano passado. Os projetos, considerados inviáveis técnica e economicamente, custaram cerca de R$ 3 bilhões.
As outras duas refinarias, em construção, tiveram orçamentos estourados em bilhões de reais, estão incompletas, projetos sendo revistos e com a estatal procurando sócios novos.
Quatro desastres, não é mesmo? De novo, sem contar a roubalheira já demonstrada pela Lava Jato.
Como tudo isso pode ter passado batido pelo Conselho de Administração? Como Dilma, a gerente, não ficou em cima desses projetos?
A nossa hipótese: nem o Conselho nem Dilma mandavam. O então presidente Lula decidia tudo. Mais de uma vez Lula se vangloriou disso, de ter determinado que a Petrobrás tivesse mais “ousadia” e mais “patriotismo” nos seus investimentos.
Mas isso apenas explica, não elimina a responsabilidade de Dilma Rousseff como presidente do Conselho. Digamos que não fosse possível ou fosse muito difícil apanhar as propinas que rolavam por baixo do pano. Mas certamente era possível, e até fácil, desconfiar dos projetos, dos negócios e dos valores envolvidos. Ou da estratégia: construir quatro grandes refinarias ao mesmo tempo? Ela tinha que saber.
O que leva a outra questão, a do momento: o que Dilma sabia ou devia saber sobre suas duas campanhas eleitorais? Ela foi designada candidata por Lula. A engrenagem de Lula montou as duas campanhas com João Santana. Sim, Dilma escolheu alguns colaboradores seus na campanha e no governo, mas a gestão de tudo foi sempre dividida com Lula e seu entorno.
Com a repetição de denúncias de caixa dois e dinheiro de propina nas campanhas, de duas, uma: ou Dilma sabia e deixou passar, ou não sabia e Lula é o responsável por tudo. Mesmo neste caso, porém, como na Petrobrás, nada elimina a responsabilidade da presidente.
Na melhor das hipóteses para ela, Dilma cometeu um equívoco fatal para o país. Ali onde ela teria visto “a riqueza do Brasil” estava a maior corrupção da história do país e uma gestão destruidora.