Esse apagão é nosso

A gente tem que admitir: dadas as circunstâncias, o pessoal da presidente Dilma saiu-se muito bem no dia do apagão. Não estava nada fácil garantir a segurança do sistema elétrico no momento mesmo em que faltava luz para 6 milhões de pessoas, em 13 estados e mais o Distrito Federal. E isso no improviso: a coletiva de terça fora chamada para garantir que não haveria apagões; a energia pifou mal as autoridades começavam a explicar. Tudo considerado, a resposta foi, em interpretação livre, a seguinte: o nosso apagão é muito melhor.

          Ainda completaram: melhor que os apagões do governo FHC, melhor do que os ocorridos em outros países e melhor mesmo que aqueles verificados no próprio governo Dilma. Como? A rapidez com que se detectou o duplo curto-circuito e, mais importante, a rapidez com que se restabeleceu o sistema – isso é primeiro mundo, pessoal.

         Primeiro mundo, não. Foi mal. A presidente Dilma acha que eles, do mundo desenvolvido, têm feito praticamente só coisas erradas. Na linguagem do governo, portanto, o apagão de terça é Brasil, assim como a nossa Copa será a Copa das Copas.

         Assim como a política econômica brasileira, com tudo – inflação, superávit primário e contas externas – na meta. Vá lá, alvo ampliado, mas e daí?

         O problema é que os chamados agentes econômicos – as pessoas que compram, vendem, produzem, consomem, poupam e gastam – não estão  acreditando que o nossa energia, quer dizer, nossa economia está brilhando.

         Perguntas e dúvidas embaraçam, aqui e ali. No apagão, não se sabe bem se a culpa de tudo foi mesmo o duplo curto-circuito. E mais, por que teria ocorrido o curto? E por que um “curtinho” termina num apagão?

         Uma investigação, digamos, normal talvez procurasse alguma ligação entre a falha e circunstâncias como: sobrecarga do sistema, uso seguido no pico, já que houve um recorde de carga três minutos antes da luz pifar.

         Negativo, assegura a equipe elétrica de Dilma, tão firme quanto a equipe econômica. O pessoal pode não saber ainda a causa – tem uma reunião hoje para discutir isso – mas garante que não há sobrecargas, nem “estresse estrutural”.

         Em resumo, até aqui, a resposta é essa mesmo: apagão é apagão, acontece. O que queriam, que não ocorresse nenhum problema num sistema tão grande? A convicção das autoridades do setor elétrico é muito mais firme que o próprio sistema, disso não há dúvida.

 

         Só não é mais firme que a convicção da presidente Dilma e do ministro Mantega quando falam de economia.

         E entretanto, parece que, na política econômica, o governo vai tentar dar uma satisfação ao distinto público. Ou seja, fazer algumas mudanças sem admitir que se está mudando. Ou anunciar mudanças sem mudar nada – dizem os céticos.

         O problema é que há problemas reais. No setor elétrico, por exemplo, há um erro de fundo: o preço. A tarifa cobrada dos consumidores, residenciais e industriais, reduzida à força no ano passado, resulta mais barata que o custo de produção. Isso cria um incentivo às avessas: estimula o uso de um serviço caro e que não está sobrando. E não estimula o investimento para aumentar o oferta, pois as empresas do setor só não quebraram porque o governo federal lhes passou mais de R$ 20 bilhões no ano passado – dinheiro do contribuinte.

         Eis, num detalhe, algo que se passa no modelo Dilma como um todo: muito consumo, pouco investimento.

         Há duas possibilidades de se manejar o desequilíbrio financeiro do setoe elétrico: ou aumentar a tarifa ao consumidor ou o Tesouro usar dinheiro dos impostos para cobrir os buracos.

         Alta da tarifa bate na inflação. Não haveria problema se fosse verdade que a inflação está controlada, não é mesmo?

         O Tesouro pagar a diferença – isso reduz o superávit primário, piora o estado das contas públicas, sob desconfiança das agências de classificação de risco. Também não seria problema se as contas públicas estivesses equilibradas…

         E tem a política: a redução da conta de luz é ponto de campanha. Subi-la agora, justo no ano eleitoral e no momento em que a outra promessa de redução, a dos juros, já foi descumprida? Sim, descumprida: o Banco Central está elevando a taxa básica. Por que faria isso se dólar e preços estivessem controlados?

         Em resumo: apagão acontece – esses curtos…- mas o sistema é uma fortaleza. Preços sobem – esse mercado internacional…. – mas não tem inflação. O superávit está caindo, mas a culpa é dos governadores e prefeitos, pois no federal vai tudo bem.

         Os outros é que não entendem nada.

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