. — e TAMBÉM REDUZIR JUROS —
É verdade que as empresas ganharam muito dinheiro no Brasil nos anos recentes. Há várias provas. A arrecadação de imposto de renda de pessoa jurídica, por exemplo, encheu os cofres do governo. Outra prova: os investimentos, até o ano passado, vinham crescendo em ritmo acelerado, e isso só pode significar que as companhias estavam reaplicando lucros para aumentar sua capacidade de produção. Outra prova de que as empresas ganharam dinheiro: contrataram mais trabalhadores e, especialmente, mais trabalhadores com carteira assinada.
O presidente Lula não se cansou de alardear esses fatos. Já agora, em meio à crise, as empresas passaram para a categoria de culpadas. O presidente e seu ministro do Trabalho, Carlos Lupi, dizem que as companhias não podem demitir hoje porque ganharam muito dinheiro no passado. Vai daí, o governo ameaça só dar crédito para as empresas que não façam demissões.
Tudo se passa como se as companhias tivessem acumulado em caixa o lucro obtido nos últimos anos. Ou pior, como se os seus donos tivessem embolsado os ganhos e mandado para algum paraíso fiscal. Agora, essa gente estaria ameaçando com demissões para obter favores do governo.
Do outro lado, estariam os trabalhadores que, na palavra de Lupi, não criaram essa crise e, portanto, não podem pagar por elas. Logo, nada de demissões, nem de flexibilização dos contratos de trabalho ou reduções de salários.
Além do clássico sentimento anti-capitalista, que percebe as empresas como predadoras, há aí um desentendimento total de como funcionam as companhias e, no geral, como anda a economia de mercado. Começa que as empresas brasileiras, como os trabalhadores, não causaram a crise.
No funcionamento, as empresas combinam recursos próprios e financiamentos. No dia a dia, a companhia toma dinheiro no banco para comprar matérias primas e pagar os salários durante a produção. Vende, faz dinheiro, lucra, paga o banco e segue a ciranda.
Ou seja, sem financiamentos e sem lucros, não tem negócio.
Ora, os dois problemas aconteceram nesta crise. O primeiro foi a falta de crédito, que simplesmente desapareceu no mercado internacional. Ora, bancos e empresas brasileiras, sobretudo as grandes (como a Vale e a Petrobrás) e as exportadoras, obtinham boa parte de seus recursos no exterior. Com quem exatamente? Com os bancos globais, aqueles que o presidente Lula agora chama de jogadores do cassino financeiro.
Sem o dinheiro de fora, as companhias foram buscar aqui dentro. E não tinha para todos. Refutado: faltou financiamento e só isso já seria suficiente para reduzir a produção. A companhia vai ao banco levantar 100 mil reais e só consegue 50 mil. Com isso, obviamente, vai comprar menos matéria prima e não terá o dinheiro para pagar os salários de todos os funcionários.
Mas e os lucros do passado, onde está esse dinheiro?
Está por aí.
Está no caixa do governo, quer dizer, esteve no caixa do governo e passou para o bolso dos funcionários, das pessoas do Bolsa Família, dos aposentados. Está também nas obras do PAC e no custeio da máquina pública.
Esse lucro está também em fábricas, lojas, shoppings, minas, siderúrgicas, construídas ou ampliadas nos últimos anos, num ritmo forte de investimentos.
Ainda em 2002, o país produzia e vendia 1,5 milhão de veículos por ano. Chegou perto dos 3 milhões em 2008. As montadoras contavam, para os próximos anos, com um crescimento não tão forte, mas contínuo.
Em vez disso, o mercado encolheu, por falta de crédito para a montadora e para o comprador de carros. E aí? A montadora tem máquinas e pessoas para produzir 50 mil automóveis, mas precisa fazer apenas 20 mil. A siderúrgica, que vende aço para a montadora, tem capacidade para 100 mil toneladas, mas encomendas novas de 50 mil. E por aí vai.
Está aí o problema do desemprego. Se há restrição de financiamento e mercado encolhido, como a empresa formará os recursos para pagar seus funcionários? É neste momento que surge a opção da flexibilização do contrato de trabalho.
Concretamente: a empresa está com mil funcionários, mas precisa de apenas 500, dado o volume atual da produção, e só pode pagar o salário desses 500, dada a falta de crédito e de vendas. Coloca-se a alternativa: demite 500 e mantém os outros com o mesmo salário ou reduz os salários e mantém os mil, enquanto dura a crise?
Querer que a empresa funcione como se nada tivesse acontecido, é prejuízo certo, coisa que pode acontecer por algum tempo, como está acontecendo. Mas continuar assim significa eliminar todos os mil empregos.
Também não faz sentido o governo emprestar dinheiro para a empresa, exigindo desta a garantia de manutenção do emprego. Seria jogar fora dinheiro público.
As empresas, neste momento, precisam de mais capital e o consumidor, de mais folga para comprar. Logo, o governo deveria reduzir impostos das empresas, de todas, sem privilégio. Pagando menos IR, a companhia tem mais capital pagando menos impostos sobre a folha, pode empregar mais.
E reduzindo imposto das pessoas, o governo deixa mais dinheiro no bolso do consumidor. E se sobrar algum dinheiro, o governo deveria investir. Resumo da ópera: flexibilização, redução de impostos e gastos em boas obras.
Publicado em O Estado de S.Paulo, 26 de janeiro de 2009