REDUZINDO O GASTO PÚBLICO

. Menos é melhor     
O economista José Alexandre Scheinkman resume uma conta de clareza arrasadora: o setor público brasileiro (governos federal, estaduais e prefeituras) arrecada 37% do Produto Interno Bruto (PIB); faz um superávit primário de 5%, com o que paga parte da conta de juros; e gasta 32% com previdência, pessoal, custeio e investimentos.     
Ou seja, o setor público dispõe de um terço do PIB para gastar. É muito ou pouco? É muito quando comparado, como se deve fazer, com países de renda parecida e mesmo com nações bem mais ricas, como a Coréia do Sul. Em geral, o gasto público desses outros fica ao redor dos 25% do PIB.     
E não se pode dizer que o Brasil ofereça mais e melhores serviços públicos. Aliás, ainda na semana passada passou quase batida uma notícia que, entretanto, resume à perfeição a situação nacional. O Departamento Penitenciário Nacional informou que a manutenção de um preso custa, em média, R$ 1.500,00 mensais. Isso equivale a um aluguel em um flat de luxo em qualquer capital. Mais ainda. Esse custo bate de longe qualquer outro na América Latina. É, simplesmente, mais do que o dobro do verificado nos países que vêm em segundo lugar, Costa Rica, Argentina e México, que gastam em torno de 650 reais mensais por preso.     
Não consta que os presídios brasileiros sejam duas vezes melhores.     
Tudo considerado, o gasto público com pessoal, previdência e custeio está aumentando há mais de dez anos. Só não aumentaram, ao contrário, caíram em proporção do PIB, os investimentos, o gasto bom, hoje em torno de 0,6% contando só o governo federal. E que gasta pouco mais de 21% em custeio e transferências a estados e municípios. Dez anos atrás, a relação era: 1,1% do PIB com investimentos; e 15,4% no corrente. O gasto maior foi pago com mais impostos.     
A situação continua exatamente igual neste ano. Na última sexta-feira, a Secretaria do Tesouro mostrou os números do governo federal para janeiro/outubro. A despesa primária, que exclui o pagamento de juros, subiu 14,8% em relação ao mesmo período do ano passado. O superávit primário, justamente a economia para pagar juros, subiu 16%. Tudo isso, de novo, pago com o forte aumento na receita tributária (16%).     
O Tesouro informa ainda que a folha de pagamento do governo central cresceu relativamente pouco até aqui, 6,5%, sempre considerando janeiro/outubro sobre o mesmo período de 2004. Mas, alerta, ?um número significativo? de aumentos salariais concedidos nos últimos meses fará com que, ao final de 2005, a folha cresça 12,5%, ?bem acima da inflação?, como, aliás, todas as demais rubricas.     
E, no entanto, vem a ministra Dilma Rousseff dizer que é preciso aumentar o gasto público. Não só ela. Perguntem ao pessoal da segurança ? e eles vão dizer que falta dinheiro para presídios e, aliás, o governo alardeia que está construindo mais. Não seria o caso, antes disso, de verificar por que o preso brasileiro sai muito mais caro para ser tão mal tratado?     
Por aí vai. Em todos os setores, é a mesma coisa. Gasta-se mais e pior.     
E mesmo que não fosse assim, não haveria como aumentar. O governo tem três maneiras de financiar suas despesas: fazendo inflação, tomando dinheiro emprestado e tomando mais impostos da sociedade.     
O Brasil já exauriu os três modos. Tivemos a superinflação, a carga tributária saltou de 25% para 37% do PIB e a dívida líquida do setor público já bateu os 60% do PIB e, hoje, depois de enorme esforço fiscal, está entre 51% e 52%. A carga tributária nos países emergentes parecidos gira em torno dos 25%. A dívida não passa dos 30%.     
Eis aí a principal razão pela qual a taxa de juros brasileira também é campeã mundial.     
O resumo da ópera: o gasto público corrente aumentou muito e continua aumentando, nos últimos anos financiado por elevação de impostos, depois de ter sido coberto com inflação e dívida. Esta, em consequência, está muito acima dos limites da prudência (abaixo de 40% do PIB).     
Logo, necessariamente, a prioridade um da política econômica brasileira é reduzir a dívida. Para isso, é preciso aumentar o pagamento de amortizações e juros. Ou seja, fazer o superávit primário necessário para ter o dinheiro suficiente para abater a dívida.     
Não dá mais para fazer superávit via aumento de impostos, já excessivamente altos. Não se deve fazer inflação. E não dá para aumentar a dívida. Única saída, portanto: conter o gasto público. Como? Não é preciso derramar o sangue ? demitir funcionários, fechar universidades, etc. Bastaria, de início, determinar que as despesas seriam mantidas nos níveis atuais, sem aumento real. Com o tempo, o crescimento do PIB e, pois, da arrecadação tributária, fariam com que o gasto público fosse caindo proporcionalmente. Seria possível até determinar que o gasto corrente em relação ao PIB caísse um pouquinho a cada ano.     
Com o passar do tempo, sobraria dinheiro para o governo, que seria utilizado em três fins nobres: pagamento de dívida, redução de impostos e aumento de investimentos em infraestrutura.     
Sem contar que, com o congelamento dos gastos, todo o setor público seria levado a buscar mais eficiência. Por exemplo, prender mais gente com o mesmo dinheiro ou formar mais alunos com a mesma verba. (Só para provocar: que tal conceder presídios à iniciativa privada. Se as empresas ganham dinheiro hospedando pessoas por 1.500 reais em ótimos apartamentos, conseguirão manter presos por muito menos, não parece lógico?).     
Bastaria anunciar esse plano de ajuste das contas públicas e os juros começariam a cair. A despesa financeira do governo se reduziria e, de novo, sobraria mais dinheiro para os fins nobres.     
E nada disso é descoberta recente. Vários países fizeram isso e vão bastante bem, obrigado. Gastar menos é melhor, pelo menos nesta situação. Publicado em O Estado de S.Paulo, 28/novembro/2005

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