PAGAMOS MAIS CARO. E AGORA?

–De malhas, a vinhos, automóveis e remédios: por queé mais caro aqui?—

A globalização contemporânea apresenta esta vantagem: amplia a capacidade do consumidor de comparar preços. Os computadores, jogos eletrônicos, celulares, roupas, tênis, perfumes etc. são os mesmos pelos shoppings mundo afora. Aliás, os shoppings são iguais. Viagens internacionais mais freqüentes e baratas e, sobretudo, a internet completam o quadro. Dá para saber o preço de um carro em qualquer país.
O consumidor brasileiro está ligado nisso e já toma consciência de como os mesmos produtos são muito caros por aqui. A coluna da semana passada, mais a reportagem e o comentário no Jornal da Globo de quinta passada, trouxeram ampla variedade de emails e relatos de experiências diversas.
Eis alguns exemplos:
. Luiz Brandão chama a atenção para os remédios. Conta que um medicamento produzido pela AstraZeneca, chamado Nexium um esomeprazol, custa na Argentina a metade do preço praticado no Brasil.
. André Blau, de São Paulo contou: ?Minha esposa me comprou de presente um pullover sem mangas, pelo qual ela pagou R$ 240,00. A peça não passou na primeira lavagem. Saiu com aparência feia e cheia de bolinhas. Aí, entrei na Internet e comprei da Inglaterra malhas feita de Cashemere misturada com lã merinos. Paguei cerca R$ 60,00, inclusive com despacho. Paga-se com cartão de crédito. Na alfândega brasileira, passa sem pagar imposto todo o pacote que tem até 03 ou 04 malhas?.
. Antonio Carlos Reis, de Piracicaba, contou sobre a diferença de preços entre de uma mesma Pick-Up aqui e em Buenos Aires. E pergunta: podemos, em um fim de semana, eu e minha mulher tomar um vôo para Buenos Aires, para um passeio romântico e de lá voltar na desejada Pick-Up? Pelo que sei sobre comércio exterior na esfera do Mercosul, não há imposto de importação?.
. Edson Pinto, que ajudou um filho a montar loja em shopping, conta dos custos elevadíssimos para se fazer negócios no Brasil. São custos públicos, digamos assim, como os impostos e as infinitas taxas. Lá pelas tantas, relata, ?entra o ECAD e exige pagamento de taxas pela a música que o caixa ouve no computador da loja a prefeitura exige que a vitrine tenha faixas para evitar que os clientes desatentos batam a cabeça no vidro o PROCOM passa e multa porque um determinado produto entre dezenas na vitrine não traz o preço?. E dos custos privados, ou seja, aqueles cobrados pelos administradores dos shoppings. Tudo somado, diz nosso leitor, o empresário tende a colocar margens brutas muito elevadas, que lhe parece a melhor saída para enfrentar os custos atuais e possíveis no futuro. Resultado: ?Vira um jogo de malandragem necessária onde a lei da oferta e da procura clássica só se sustenta a curto prazo. Claro que poucos comprarão. Talvez se venda em quantidade suficiente para ganhar algum. Se não, parte-se para outro produto e a roda viva continua até que o pequeno comércio, sonhado pelos jovens que acreditam inocentemente no País, vá se incorporar à estatística tenebrosa da mortalidade precoce de novos negócios no Brasil?.
Tudo considerado, há cinco classes de problemas:
. Impostos: não a há a menor dúvida, a carga tributária impõe custos elevados ao consumidor. O caso dos remédios é dramático: em um medicamente de dez reais, o governo pega R$ 3,50, mesmo para produtos de uso contínuo. Em produtos eletrônicos, a carga pode chegar à metade do preço final.
. O custo de fazer negócios no Brasil: uma pesquisa nacional da Firjan mostra que a abertura de uma empresa exige de seis a oito etapas burocráticas, pagamento de 12 a 16 taxas, tudo com 43 documentos (alvarás, licenças, etc.). Abrir uma empresa pequena no Rio, no ramo da alimentação, sai por mais R$ 5 mil. Há estados em que os Bombeiros cobram R$ 2.500 para dar um alvará. Em Santa Catarina, a OAB local tabelou em R$ 2.681,00 o trabalho do advogado de assinar o contrato de abertura de empresa, em geral um contrato padrão. Um estudo da Fiesp calcula que as empresas brasileiras gastam anualmente cerca de R$ 45 bilhões com a burocracia. Uma enormidade, equivale a 1,5% do PIB. Incluem-se aqui custos trabalhistas e o dinheiro e a energia aplicados pelas empresas nas relações com o Fisco.
Custo da infra-estrutura: fretes elevados e demorados, taxas e tempo perdido nos aeroportos e portos, etc.
Ineficiências ? o trabalhador brasileiro, com educação comprometida, produz menos, absorve de maneira limitada as novas tecnologias.
Margens elevadas ? ou porque o mercado é protegido ou porque, como diz Edson Pinto, é a defesa que o empresário, especialmente o menor, encontra para se manter à tona.
Soluções?
Obviamente, é preciso reduzir a carga tributária. Não é simples, porém. O governo arrecada muito porque gasta muito. Logo, sem uma redução do gasto público, sem uma limitação no tamanho do Estado, não haverá como diminuir impostos.
Mas é possível adotar desde já algumas medidas emergenciais, como retirar a carga de produtos essenciais, como medicamentos.
Outras soluções foram indicadas pelos nossos leitores: abertura dos mercados. Se, por exemplo, fosse possível ir a Buenos Aires, comprar o carro e trazê-lo para cá, essa competição pressionaria os preços brasileiros. (O leitor Reis pode passear na Argentina, mas não conseguirá nem comprar a Pick-Up, nem circular com ela por aqui).
André Blau conseguiu uma boa saída via internet. Há muitos sites confiáveis, mas isso é limitado a compras pequenas. E nem é bom falar muito, porque daqui a pouco vão tentar cortar essa onda.
Facilidades maiores nas compras de quem vem do exterior são limitadíssimas. E injustas. Beneficiam a parte da população que tem dinheiro para viajar. Impostos menores e abertura às importações beneficiariam a todos.
Reduzir burocracias e o custo de se fazer negócios no Brasil é muito possível. São mudanças no nível micro-econômico, que podem ser feitas por prefeituras, por exemplo.
Infelizmente, não temos visto esses temas na campanha eleitoral. Mas a consciência dos consumidores é cada vez maior. Um bom começo.
Publicado em O Estado de S. Paulo, 23 de agosto de 2010

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