O GOVERNO ATRAPALHANDO

. Planos já furados     
As hidrelétricas de Santo Antonio e Jirau, no rio Madeira, constam do PAC e formam o empreendimento mais importante no setor. No Plano de Expansão do Ministério de Minas e Energia, a usina de Jirau deve estar funcionando em janeiro de 2011 e a de Santo Antonio, um ano depois. Somadas, devem garantir 6.450 MW. Quando nega que o país corre o risco de apagão a partir de 2009/2010, o ministro Sillas Rondeau inclui na sua conta aquelas duas usinas.     
Mas a licença ambiental prévia, condição para que o empreendimento seja licitado, não saiu mais uma vez. Depois de sucessivos adiamentos, o Ibama havia prometido dar sua palavra até o final de fevereiro. Consultado em 1o. de março, o órgão, pela sua assessoria de comunicação, informou que continuava estudando o assunto e que não havia mais prazo para a decisão.     
Isso significa que o planejamento já furou. Entre a licitação e o início da geração de energia, passam-se cinco anos, isso no mínimo, quando não ocorrem problemas. Assim, na melhor da melhor das hipóteses, supondo que o Ibama conceda a licença ainda neste ano, as usinas do rio Madeira gerariam energia a partir de 2012.     
E ainda nem se falou das linhas de transmissão, pois a energia do Madeira destina-se, na maior parte, a outras regiões do país. Construir linhas de transmissão em plena Amazônia é uma obra complexa, sendo complexa também o licenciamento ambiental.     
Eis o ponto: o governo está contando com obras de improvável realização, pelo menos nos prazos anunciados. Começa que a licença ambiental pode não sair. Ou pode sair mais atrasada ainda e com exigências de novos estudos e providências. Obras grandes como essas sempre dão problemas e demoram mais que o planejado.     
Junto com outra mega-usina, a de Belo Monte, no rio Xingu, igualmente problemática, os investimentos em energia previstos pelo PAC para a região Norte chegam a R$ 24,4 bilhões. Não se fará. Com sorte, talvez saia uma pequena parte disso.     
O Ministério de Minas garante que tem um plano B para a falta da energia do rio Madeira. Mas todas as alternativas são piores, mais caras e/ou sujas, como as termoelétricas alimentadas a óleo, já que não há garantias do abastecimento de gás.     
Estão aí, portanto, dois planos furados, o PAC e o de expansão da oferta de energia.     
Assim vai: análises mais cuidadosas do PAC revelam falhas semelhantes. Um exemplo que não passou despercebido pelo mercado. A Petrobrás, principal motor do PAC, anunciou um expressivo aumento nos seus investimentos apenas três dias antes de Lula anunciar seu programa de crescimento.     
O PAC conta ainda com investimentos privados em estradas federais a serem concedidas, mas o governo não consegue lançar os editais. Há investimentos previstos nas Parcerias Público-Privadas, mas nenhuma saiu do papel.     
Tudo vai confirmando a desconfiança inicial, o PAC é mais propaganda do que plano de ação. Como propaganda vai bem, obrigado.     
Quer dizer que o país não vai crescer?     
Não, quer dizer que o país cresce com as forças que já tinha e que não serão aceleradas. Essas forças vêem de um cenário externo extremamente favorável, que continua estimulando exportações; inflação no chão, que aumenta o poder aquisitivo local; dólar barato que tem permitido importação de máquinas e equipamentos para atualizar os meios locais de produção; e a capacidade dos empreendedores do Brasil moderno.   Livre comércio     
Enquanto o Brasil, com o Mercosul, continua em negociações intermináveis, o Chile acaba de anunciar que fechou um Tratado de Livre Comércio com o Japão.     
Agora, o Chile tem acordos com as três potências asiáticas ? já fechara tratados com China e Coréia do Sul. Isso representa um mercado livre de 2,5 bilhões de consumidores.     
O Chile também tem tratados de livre comércio com os EUA, México, União Européia e outras quatro dezenas de países. E é membro associado do Mercosul.     
Mas, como se sabe, o Chile só faz coisas erradas. Deveria largar esses tratados com os imperialistas e entrar como sócio pleno do Mercosul, como a Venezuela, não é mesmo?     
A sério, o Uruguai, encalacrado no Mercosul, deveria prestar atenção no exemplo chileno. País igualmente pequeno, precisa de mercados pelo mundo afora, mas não pode porque o Mercosul limita o espaço para acordos comerciais com terceiros países.     
Basta olhar a situação atual de cada país para se verificar qual fez a opção correta.   Meirelles é o cara     
Para entender a questão do Banco Central: o chefe lá é o presidente do banco, Henrique Meirelles. Ele tem nível de ministro e, assim, reporta-se diretamente ao presidente Lula. Na hierarquia, ele está no mesmo nível do ministro da Fazenda, Guido Mantega.     
Politicamente, é claro que os ministros não são todos iguais. Alguns mandam mais, como é o caso da ministra Dilma Roussef.     
Mas também politicamente Meirelles exerce sua autonomia. No Brasil, o BC tem autonomia de fato, não de direito. FHC, que introduziu o regime de metas de inflação, deu autonomia a seus presidentes de BC. Lula manteve a prática, mas com esse acréscimo importante: colocou na lei que o presidente do BC é ministro de Estado.     
Com isso, conforme Meirelles comenta sempre, garantiu-se 50% de autonomia formal para o BC.     
Tudo isso para dizer o seguinte: trocas de diretores do BC não indicam  mudança de política monetária. Meirelles continua comandando a diretoria e o processo de escolha de seus diretores.     
Ou seja, só haverá coisa importante por lá se o próprio Meirelles deixar o cargo.   Afonso Bevilaqua        
Independente de qualquer outra análise, a saída de Afonso Bevilaqua é uma perda para o BC e para o Brasil. Trata-se de um economista do primeiro time, que brilharia em qualquer BC do mundo. Exerceu influência teórica e prática, com seu trabalho na sistematização e institucionalização do sistema de metas de inflação, um evidente sucesso. Foi um luxo para o Brasil ter um quadro como Bevilaqua na direção da política monetária.  Publicado em O Estado de S.Paulo, 05 de março de 2007

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