NÃO HÁ DINHEIRO PARA INVESTIMENTO PÚBLICO

.  Cem bilhões de reais      
Cem bilhões de reais ? esse é o número. É o dinheiro extra a ser aplicado em investimentos para que o país possa crescer 5% no próximo ano. Esses são os recursos que o presidente Lula vem procurando encontrar desde que ganhou as eleições e garantiu que desta vez o país há de crescer.     
Cem bilhões de reais de novos investimentos ? é muito ou é pouco?     
É muito. Equivale a 5% do Produto Interno Bruto, o valor de tudo que se produz no país, incluindo mercadorias e serviços. Hoje, o Brasil investe 20% do PIB e isso, conforme razoável entendimento entre os economistas, garante um crescimento anual de 4%, em boas  circunstâncias locais e internacionais. Para elevar essa capacidade de crescimento para os 5% ao ano,  por um longo período, o investimento anual precisaria aumentar cinco pontos percentuais, chegando aos 25% do PIB – os tais R$ 100 bilhões.     
Como o presidente Lula tem percebido, o setor público não tem como arrumar esse dinheiro. Essa, aliás, é a fonte da irritação que Lula tem exibido quando fala do assunto ?destravar a economia?.     
Entretanto, faz tempo que se sabe que o governo, nas condições atuais, não tem como ampliar seus investimentos.     
Pedindo desculpas para apresentar alguns números, eis os dados básicos: até outubro último, o governo federal gastou 133 bilhões de reais pagando benefícios da Previdência; R$ 83 bilhões com salários do funcionalismo; R$ 56 bilhões com juros; R$ 96 bilhões com ?custeio e capital?. São os gastos efetivamente feitos com o dinheiro arrecadado com impostos, taxas e contribuições. A conta de juros é maior, mas o governo paga apenas uma parte e rola o que sobra.     
Os investimentos (aplicações em estradas, portos, etc) estão na rubrica ?custeio e capital?. Mas a maior parte vai para o custeio, despesas com o funcionamento da máquina, itens que incluem de merenda escolar a controle do tráfego aéreo. O que sobra para investimento é muito pouco, menos de R$ 15 bilhões daquele bolo de  R$ 96 bilhões.     
 Consolidando: o governo federal gastou até outubro R$ 297 bilhões em Previdência, pessoal e custeio. De onde tirar mais 100 bilhões? Isso será equivalente, ao final do ano, ao total da folha de salários. Ou ainda: até o final do ano, o governo federal vai pagar algo como R$ 65 bilhões de juros, o dinheiro do superávit primário. Logo, mesmo que eliminasse todo o superávit e desse calote total nos credores, criando uma crise financeira, ainda assim o governo não alcançaria os 100 bilhões.     
O presidente, portanto, tem motivo para desespero. Cada vez que se reúne com a equipe econômica, o pessoal tortura os números para arranjar um bilhão aqui, dois ali tirando um pedacinho do superávit e só dá mixaria. Somando os investimentos de governos estaduais e prefeituras, o total do setor público chega a no máximo 1,5% do PIB. Considerando este ano todo, seriam R$ 30 bilhões para um PIB previsto de R$ 2 trilhões.     
Fechando as contas: o Brasil está investindo cerca de R$ 400 bilhões/ano, para os quais o governo contribui, sempre no máximo, com míseros R$ 30 bilhões. Os restantes R$ 370 bilhões vêm do setor privado, nacional e estrangeiro.     
Acrescente-se: as despesas correntes do governo federal, com Previdência, pessoal e custeio, vêm crescendo ao ritmo de 16% ao ano. Não é muito diferente nos estados e prefeituras, muitos dos quais estão falidos, como reclamou o próprio Lula nesta semana.     
Tudo somado e subtraído, tem algum jeito do governo arrumar novos investimentos sem fazer as reformas que permitam a contenção, primeiro, e redução, depois, dessas despesas correntes? Precisa ou não de uma reforma da Previdência, o maior item de despesa, com déficit crescente?     
Também vai precisar do setor privado, que já investe quase tudo e teria condições, facilmente, de arranjar mais R$ 100 bilhões para novos investimentos, se encontrasse bom ambiente de negócios. O que seria bom? Regras claras e duradouras, com segurança jurídica e de aplicação simples e rápida, que garantissem ao investidor o retorno de seus investimentos, se ele vier a fazer um bom negócio, bem administrado. E ainda não existem essas regras, por exemplo, para licenciamento ambiental, nem para o importante setor de saneamento.     
Também vai precisar privatizar. Se o governo não tem o dinheiro para estradas e usinas hidrelétricas e o setor privado tem, é óbvio que é preciso passar as obras para as companhias privadas.     
Querer os R$ 100 bilhões sem reformas e sem privatizar, só vai dar em desespero.    Publicado em O Globo, 30 de novembro de 2006

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