Do ponto de vista estritamente econômico, até que faz sentido: melhor o governo federal concentrar todo
seu déficit primário neste ano, algo como R$ 120 bilhões, para entrar zerado em 2016. Aí, bastará apenas segurar as despesas dentro das receitas e, pronto, eis de volta o superávit necessário para voltar a reduzir a dívida pública.
Por esse lado, o Congresso deveria mesmo aprovar a mudança da meta fiscal de 2015, dispensando o governo de fazer um superávit de R$ 50 bilhões, como estava na lei orçamentária, e autorizando aquele baita déficit.
Mas para que isso de fato faça sentido, é preciso acreditar que o governo Dilma terá um surto de austeridade e gastará menos do que arrecadará em 2016.
Só sendo muito tolerante e bonzinho. Reparem: o governo da presidente Dilma passou todo o ano de 2014 jurando que ia fazer o superávit determinado em lei. Verdade que foi reduzindo a meta ao longo dos meses, mas quando chegou em dezembro, bingo, estava em pleno déficit. Pediu então ao Congresso a mudança da meta, o que conseguiu, jurando que era pela última vez.
Ou seja, em dezembro do ano passado, a presidente estava na iminência de cometer um crime fiscal – o não cumprimento da meta de superávit – quando o Congresso cancelou o crime, quer dizer, autorizou o déficit. E livrou a cara do então ministro Mantega e da presidente.
Pela explicação oficial, o governo entrou em 2015 com a conta zerada. Correram os meses, e o novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e a presidente – teria sido enganada? – descobriram que o déficit de 2014 havia sido bem maior e que algumas contas haviam sido irregularmente passadas para 2015.
Para simplificar, e poupar o leitor de muitos números, chegamos a este dezembro numa situação igual à de um ano atrás. A meta de superávit não vai ser cumprida e há um déficit já contratado. Com uma agravante: o buraco de hoje é muito maior do que há doze meses. Logo, o crime é mais grave e o criminoso, reincidente.
Dirão: trata-se de um novo governo. Sim, de certo modo, é o segundo mandato da presidente e o ministro da Fazenda é outro, bem diferente, um profissional realmente comprometido com as ideias de responsabilidade fiscal e austeridade nas contas públicas.
Mas é a mesma presidente Dilma, com a mesma base e sem nenhum sinal de conversão. Aliás, uma presidente extremamente enfraquecida, sem capacidade política de aplicar as reformas necessárias para restabelecer o controle sobre as contas públicas.
Eis onde estávamos obtem: o Congresso estava votando a mudança da meta fiscal de 2015 de superávit para déficit. Em linguagem direta: estava decidindo se perdoaria de novo o criminoso fiscal, o governo Dilma, cancelando pela segunda vez o crime de descumprimento da lei orçamentária.
Economistas mais ou menos neutros concordavam que, efetivada a manobra, seria uma desmoralização do principio de Responsabilidade Fiscal, tão duramente instalado desde a introdução do Real.
Mas acrescentavam que a situação seria pior se não houvesse o perdão, ou seja, se fosse mantida a meta de superávit. Por duas consequências: uma, o governo teria de cortar praticamente todos os gastos, inclusive salários, aposentadorias e pagamentos a parlamentares, juízes e ministros — é o que manda a lei quando há déficit – e mesmo assim não conseguiria fazer o superávit de lei.
Portanto, seria uma catástrofe total no setor público e o governo Dilma continuaria cometendo a irresponsabilidade fiscal. Isso tornaria a presidente ainda mais frágil e mais suscetível a processos de impeachment.
Considerando a forte recessão que o país vive, seria acrescentar o desastre político ao desastre econômico.
E a coisa complicou de vez . O congresso aprovou a nova meta , perdoou o crime fiscal . Quase no mesmo momento , Eduardo Cunha abriu o processo de impeachment, baseado na irresponsabilidade fiscal.
A questão básica é a seguinte: existe alguma chance do governo melhorar? A economia está se encaminhando para um segundo ano de recessão inédita, com os consumidores sem confiança para gastar (e muitos sem condição por causa do desemprego) e os investidores sem planos de arriscar.
A presidente Dilma não consegue administrar nem seu principal partido, o PT, quanto mais as políticas econômicas e públicas. Chance de reformas é zero. A Lava Jato ronda os gabinetes de Brasília.
Não é melhor para o país acabar logo com isso, já que a crise é inevitável? Já está mais do que na hora de as lideranças políticas nacionais, as sérias, as que tiverem sobrado, dos dois lados, começarem a se mexer para encontrar a saída menos traumática para encerrar um governo sem condições.