. Artigos INFLAÇÃO A META E A TOLERÂNCIA A meta da inflação para este ano é de 6%, tomando-se como referência o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Ampliado, medido pelo IBGE). Mas não é 6 cravado, pode variar dois pontos para cima ou para baixo. Há uma importante sutileza nesses quatro pontos de variação. Fazem parte da meta ou constituem margem de tolerância? Sim, faz diferença. Uma coisa é dizer que a meta é algum ponto entre 4% e 8% . Outra, bem diferente, é dizer que a meta é de 6%, tolerando-se um desvio de dois pontos para cima ou para baixo. Quer dizer, os 6% podem ser a meta ou apenas o ponto médio de uma banda que seria a verdadeira meta. E essa interpretaçãopode variar conforme o momento. Até julho, o Banco Central dizia que havia “folga” em relação às metas. Já na última ata do Comitê de Política Monetária do BC, de agosto, informou-se que o repique inflacionário de julho/agosto havia eliminado aquela “folga”. Ora, folga em relação a que? Pelo que mostram os modelos, a inflação deste ano se encaminha para um pouco acima de 6% (para o mercado está em 6,3%). Ora, se a meta fosse algum ponto dentro da banda de 4% a 8% – então ainda existiria folga, e ampla, de um 1,7 ponto. Mas o BC diz que a folga acabou – e isso quer dizer, necessariamente, que a meta é mesmo os 6% – o ponto médio – sendo os dois pontos para cima uma margem de tolerância. Margem de tolerância é o que é: um desvio aceitável, mas um desvio. Ou seja não se pode abusar. Quando o ministro do Desenvolvimento, Al;cides Tápias, comentou que as metas para este ano e o próximo estavam sendo revistas para cima, estava querendo dizer que a inflação passa dos 6% (2000) e dos 4% (meta de 2001). Quando o ministro da Fazenda, Pedro Malan, e o presidente do BC, Armínio Fraga, juraram que não há qualquer revisão, mas ressalvando que as metas admitem a margem de tolerância, estavam portanto, falando a mesma coisa que Tápias: que a inflação esperada continua dentro da banda, embora já acima do ponto médio. Esta discussão não é acadêmica. TRem enorme efeito prático. Se o BC fosse xiita nos 6% e dos 4% para o ano que vem, por exemplo, já teria elevado a taxa básica de juros. É do regime de metas de inflação: se o objetivo esperado está acima da meta, elevam-se os juros. Ao manter a taxa básica de 16,5%, o BC indicou que está usando a margem de tolerância, pelo menos por enquanto. A questão é: até onde vai a tolerância? Ou seja, o BC reduz juros se a inflação de 2001 estiver embicando para, digamos, 5%? Em 1999, convém lembrar, a meta era de 8%, com a mesma margem de dois para cima ou para baixo. Deu 9% e o governo e todos os analistas consideraram meta cumprida. Para este ano, portanto, ninguém se espantará se ficar acima de 6%. Quanto acima? Um número razoável seria algo antes dos 7% – porque indicaria uma queda de dois pontos em relação a 1999 A inflação, agora em setembro, já está descalerando, depois do pico de julho/agosto. Logo será preciso recompor as expectativas. E aí veremos, pelas decisões do BC sobre os juros, qual é a real margem de tolerância. O BRASIL CRESCE 4%. ESTÁ BOM? Olhando para trás, esses 4% de hoje parecem um alívio. No ano passado, o Produto Interno Bruto ( a sona de tudo que se produz no país, de mercadorias a serviços) cresceu 1% – que é nada. É menor que o crescimento da população e muito menor que a inflação (9%). Em 1998, foi pior ainda: o PIB caiu 0,1%. Em 1997, foram razoáveis 3,2% de crescimento, uma melhora em relação aos 2,6% do ano anterior. Só em 1995, primeiro ano inteiro do Real, o país cresceu mais de 4% – exatamente 4,2% Portanto, voltar a esse nível , depois de quatro anos, pode ser visto como um bom resultado. Mas olhando para fora, é pouco. Todos os principais países emergentes exibem crescimento mais vigoroso. Na China, o PIB se expande a uma taxa superior a 8% ao ano. A Coréia vai ainda mais rápido, quase 10% ao ano. O México consegue mais de 7% e isso há um bom par de anos. Mesmo a Rússia, com submarino afundando e torre de televisão em chamas, cresce a mais de 8%. Nesse sentido, todos aproveitam muito bem a oportunidade que o mundo oferece hoje: uma bela combinação de crescimento forte nos Estados Unidos e na Europa. Dos três gigantes da economia mundial, só o Japão não avança rapidamente, mas isso não tem atrapalhado o ambiente geral de prosperidade – que só não prossegue se houver um desastre prolongado com os preços do petróleo, crise ainda improvável. E então, como ficamos? A verdade é que, dadas as atuais condições brasileira, não se pode fazer muito melhor que esses 4%. Com sorte, talvez uns 5%. Acima disso, só com uma série de reformas e mais privatizações. . Eis aqui uma ilustração desse quadro. Dias atrás, o executivo de uma fábrica de máquinas para embalagens e sacos de plástico me contava que suas vendas voltavam aos níveis dos bons anos. Daqui para a frente, acrescentava ele, começariam a aparecer alguns problemas. Por exemplo? Os clientes que só podem comprar sem nota. Isso mesmo. Muitas pequenas e mesmo médias empresas têm mercado e capital para se expandir, mas não têm como justificar isso para a Receita Federal. Não é bandidagem, é a cadeia da informalidade. O sujeito vende saquinhos de plástico para o supermercado da periferia, que não quer saber de nota. Supermercado e produtor dos saquinhos estão ampliando o número de funcionários, mas tudo sem carteira assinada, para baratear o custo. Com os negócios em alta, o supermercado encomenda mais saquinhos, o fabricante precisa de máquinas novas. Vai ao produtor de máquinas, mas esta já é uma empresa de porte, visível no radar da Receita e que por isso precisa de nota. Como faz? Não faz. Alguns observam: os informais que regularizem sua vida. Mas eles dizem que, se fizerem isso, perdem competitividade, porque os demais continuam vendendo e comprando sem nota. Essa é a demonstração da necessidade de uma reforma tributária que simplifique a vida de quem faz negócios neste país. Mas então, pode-se argumentar, o Brasil não tem chances. Basta ver as indas e vindas da reforma tributária. A minha sugestão para o debate é a seguinte: a reforma tributária vai sair, um pouco mais adiante, mas um dia sai. O palpite se baseia no seguinte: o fato é que o país passou as últimas duas décadas envolvido com dois enormes problemas macro, a superinflação e o completo desajuste das contas públicas. Foram anos só para se entender os problemas, mais alguns para resolvê-los. O país não tinha cabeça para as outras coisas. Assim, é possível que passados mais uns dois ou três anos com ajuste fiscal e sem inflação –e crescendo modestos 4% a 5% – o país possa virar essa página e se dedicar a questões de microeconomia, que afetam o dia-a-dia das empresas, como a reforma tributária É uma esperança, claro, mas faz sentido. A menos que este seja um país de idiotas, num dado momento o pessoal vai perceber que precisamos de tributos mais simples, mais facilidades para contratar e regularizar a situação de mais da metade dos trabalhadores que já estão na informalidade e assim por diante.
INFLAÇÃO E CRESCIMENTO
- Post published:9 de abril de 2007
- Post category:Coluna publicada em O Globo
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