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—A recessão acabou, o país volta a crescer. E agora?–
O IBGE divulga amanhã, sexta, os números da economia brasileira para o segundo trimestre deste ano. Indicarão o fim da recessão, que o ministro Mantega vai celebrar numa conferência telefônica internacional.
Os números do IBGE devam permanecer reservados até o dia do lançamento, pois podem, por exemplo, alterar o mercado. Mas outro dia mesmo, o ministro, que gosta de falar, disse que o Produto Interno Bruto deve ter crescido entre 1,8% e 2% na comparação do segundo trimestre com o período anterior. Pode ser que Mantega tenha deixado escapar algo, mas essa expectativa está em linha com o mercado. Todos esperam um bom resultado.
Como sempre, há várias maneiras de interpretar. O governo vai dizer que o Brasil foi o último a entrar e o primeiro a sair da crise, que, assim, terá sido uma ?marolinha?.
Não é bem assim. Muitos países saíram do buraco no mesmo segundo trimestre, todos tendo entrado mais ou menos juntos, no final do ano passado. Alguns países estão se recuperando mais vigorosamente, como os asiáticos em geral e a China em especial.
Mas, sem dúvida, o Brasil fez bonito. A atividade econômica, que vinha em ritmo muito forte antes do auge da crise, há um ano, despencou no último trimestre de 2008. Caiu de novo no primeiro trimestre deste ano, caracterizando uma recessão.
Para o segundo trimestre/09, o resultado mostrará o seguinte: expansão em relação ao primeiro, mas queda em relação ao mesmo período de 2008. Sem exageros de torcedor, isso indica que a recessão acabou. A economia bateu no fundo do poço, parou de piorar e retomou crescimento. Pode-se dizer que a crise acabou.
Mas como a economia ainda não recuperou nem a produção, nem a geração de empregos, nem o ritmo do ano passado, pode-se dizer também que a crise não acabou. Terá deixado para trás o pior momento, mas não recuperado os bons tempos.
Os números mostrarão ainda que o mercado interno cumpriu bem o papel de manter o consumo em um certo nível. Confirmarão também que a redução de impostos funcionou para reanimar vendas de automóveis, principalmente, e outros itens.
No lado negativo, os números mostram uma forte perda nos investimentos, o que compromete a expansão da produção e, pois, o crescimento futuro. E tudo considerado, temos aí uma reação típica da economia brasileira que, estruturalmente, se baseia em forte consumo das famílias e do governo e baixo nível de poupança e investimentos.
É exatamente o contrário dos asiáticos, por exemplo, com seus até exagerados índices de poupança e investimentos, com carga tributária baixa e gastos públicos menores.
Não por acaso, a China, por exemplo, saiu da crise com um espetacular programa de gastos públicos em infra-estrutura, mas combinado com crédito para o consumo interno, para compensar a queda nas exportações.
Aqui, o ministro Mantega comentou que o Brasil precisou aumentar pouco o gasto público para driblar a crise. Na verdade, o Brasil não podia aumentar mais porque já gastava muito antes da crise, continuou gastando pesado durante a crise e já programou mais gastos para o pós-crise.
Parece, pois, que o país sai da confusão com as mesmas virtudes e mesmos defeitos que tinha antes. Alguns defeitos até ajudaram. Por exemplo, a restrição do crédito foi moderada porque o crédito já era reduzido nos tempos normais. Vinha crescendo, mas estava longe de qualquer coisa parecida com uma bolha. Continua longe.
O Brasil perdeu exportações (e a conseqüente produção), mas como exportava apenas 14% do PIB, contra 80% dos asiáticos, a perda foi proporcionalmente menos danosa.
O forte consumo, sobretudo do governo, que é um defeito em condições normais, agora ajudou.
Mas não ajuda para sempre, muito menos em condições normais. As virtudes podem ser resumidas na estabilidade macroeconômica. Foi isso, e mais, especialmente, as reservas em dólares que permitiram atravessar a confusão com segurança.
Ou seja, a pior lição que se poderia tirar disso tudo é que o governo ganhou uma licença para gastar e para recolher mais impostos para financiá-los. O Brasil tomava bomba na carga tributária e no ambiente de negócios. Continua reprovado.
Publicado em O Globo, 10 de setembro de 2009