Azarada

Uma coisa a gente precisa admitir: a presidente Dilma é azarada. Bem ao contrário do sortudo presidente Lula.

É verdade que Dilma fez escolhas que se mostraram equivocadas, como a tentativa de crescer via consumo e as intervenções nos juros, nos preços, no sistema elétrico. Mas não é menos verdade que o ambiente foi desfavorável.

          Se FHC, também azarado,  havia padecido com as sucessivas crises dos emergentes (México 94, Coréia 97, Rússia 98), Lula assumiu a presidência em 2003, quando o mundo todo exibia um crescimento exuberante. E, especialmente, no momento de máxima aceleração da China, o que turbinou nossas exportações e trouxe uma enxurrada de dólares para o país. Pela primeira vez na história, o Brasil teve sobra de dólares. 

         Caiu do céu. Do céu internacional e do agronegócio, sempre tão hostilizado pelo PT. Pois foi o agronegócio que trouxe a maior parte dos dólares. 

         Lula também usufruiu dos benefícios da estabilização monetária, iniciada com o Real em 1994 e consolidada no início de seu governo, o que permitiu a volta do crédito, turbina do consumo. 

         Verdade que veio a crise financeira dos EUA (2009). Mas, como todos os demais emergentes, o Brasil estava mais preparado, em razão mesmo das reservas de dólares. 

         E se FHC havia sofrido com a maior seca da história, Lula ganhou períodos generosamente chuvosos. Verdade que houve enchentes e alagamentos, mas o apagão teria sido pior. 

         E por falar em azar, Dilma está apanhando uma seca parecida com a de FHC. A presidente também apanhou com os efeitos da crise financeira. Primeiro, pegou recessão nos países desenvolvidos e quando estes começaram a se levantar, os emergentes, e especialmente a China, desaceleraram. O comércio externo virou, dos superávits enormes, para um déficit real. 

         O Fed, banco central dos EUA, primeiro, inundou o mundo de dólares baratos, forçando a valorização das moedas emergentes; agora, está retirando dólares, forçando desvalorizações – e inflação. 

         Os efeitos da estabilização monetária e da volta do crédito se esgotaram. E os truques da era Lula, como a falsa capitalização da Petrobrás ou a equivocada aliança Sul-Sul,  começaram a mostrar seus efeitos negativos. 

         O Brasil e os emergentes em geral, de queridinhos, viraram fonte de instabilidades. 

         Só falta Dilma perder a Copa. 

 

 

          Com racionamento?

 

         De uma entrevista na CBN (quarta-feira) com o engenheiro Mário Veiga, presidente da consultoria PSR, e um dos mas respeitados especialistas no setor elétrico: 

         . Há um risco de racionamento de 18,5%; racionamento, no caso, quer dizer, falta de mais de 4% da demanda por energia, algo equivalente a deixar sem luz 12 milhões de residências; 

         . Embora seja verdade que, por oposição, há uma chance de 81,5% de não ocorrer racionamento, o risco de 18,5% é muito elevado para os padrões do sistema; 

         . O problema não decorre da atual seca, nem do excesso de demanda; o sistema vem dando sinais de dificuldades há anos; 

         . Não é o caso de se recorrer agora a um racionamento preventivo; dá para esperar até abril, ou seja, até o final do período de chuvas; pode ser que São Pedro ajude; mas um racionamento é uma complexa operação, que não pode ser improvisada; ou seja, deveria estar sendo preparada; 

         . Há óbvios atrasos na entrada em operação de usinas e sistema de distribuição; 

         . Há problemas estruturais; não se pode dizer que está tudo em ordem quando o sistema está usando todas as termoelétricas (espécie de seguro) e quando as usou mesmo em tempos de chuva; 

         . Os últimos anos mostram também uma série de trapalhadas do governo, que deixaram distribuidoras sem energia contratada, obrigando-as a recorrer ao mercado livre, pagando preços muito mais elevados (hoje, de R$ 1.700/megawatt/hora); 

         . O prejuízo tem que ser pago pelo Tesouro (pelo contribuinte brasileiro) ou pelo consumidor, na tarifa, já que a culpa do desequilíbrio financeiro não é das distribuidoras, nem das demais empresas do setor. 

         . Simplificando, e sem contar os rombos do ano passado, o Tesouro teria que repassar, em 2014, cerca de R$ 24,5 bilhões; ou aplicar um aumento de tarifas de 24%. 

         Eis, portanto, o dilema da presidente Dilma: aumentar o gasto público -e prejudicar a realização do superávit primário, num ambiente de desconfiança com as contas do governo – ou elevar tarifas, com forte impacto numa inflação já alta, isso exigindo juros mais altos – tudo com prejuízo político. 

         Uma bela enrascada – trapalhadas em cima de azar.

Ouça entrevista na integra: http://sardenberg.com.br/index.php/component/k2/item/11280-entevista.html

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