. A VIRADA DOS JUROS – A CONTROVÉRSIA Há diversas – e contraditórias – interpretações para a decisão do Banco Central de elevar a taxa básica de juros de 15,25% para 15,75%, tomada na quarta, 21/03, à noite. Mas há um ponto em comum: todas as análises trazem alguma crítica ao BC, ou à própria decisão ou ao modo como eles fizeram a coisa. Começamos com uma grande divisão, entre os que acharam correta a alta dos juros e os que a consideraram um grande equívoco. Há vários argumentos a favor da alta. Para alguns, tudo se resume na conclusão de que houve uma piora acentuda no cenário de curto prazo, em consequência das turbulências nos EUA, da crise argentina e dos sinais de queda de crescimento mundial, isso do lado externo, e da crise política na base do governo FHC. Tudo isso somado deu no chamado "estresse" (assim mesmo, abrasileirado) da taxa de câmbio, isto é, na disparada do dólar. Se a alta do dólar pode vir a afetar a inflação lá na frente, o BC tinha mesmo que elevar os juros desde já, entendendo-se que essa alta dos juros deveria provocar uma queda do dólar. Para outros analistas, não há qualquer problema de inflação à vista. A meta para este ano é de 4% e as últimas estimativas estavam acima disso, mas ainda confortavelmente dentro da margem de tolerância, dois pontos acima ou dois abaixo. Ou seja, a inflação pode ficar entre 2% e 6%, que estará na meta. Assim, não haveria motivo para se elevar os juros se a expectativa está, por exemplo, em 4,5%. Não havendo ameaça de inflação, o problema estaria no excessivo crescimento da economia brasileira neste momento, quando a economia mundial está desacelerando. Esse descompasso levaria a um aumento do déficit brasileiro no comércio externo. Crescendo forte, a economia brasileira aumenta as importações. Com o mundo crescendo menos ou em recessão, o Brasil não consegue aumentar as exportações. Aumenta o déficit comercial, faltam mais dólares, a cotação tende a subir, evidencia-se a chamada vulnerabilidade externa – ou seja a dependência de capitais externos. (E por sinal, a entrada de investimentos externos diretos andou fraca nas últimas semanas, incapaz de cobrir o déficit das contas externas). O resumo disso tudo é que havia razões técnicas para uma alta dos juros. O problema é que o próprio Banco Central e também o ministro da Fazenda, Pedro Malan, vinham desenhando um cenário otimista. Em particular, insistiam que as turbulências do momento eram isso mesmo, momentâneas. Além disso, acrescentavam, o mercado estava exagerando na sua reação e desconsiderando os excelentes fundamentos da economia brasileira que a credenciavam a navegar nesse mar revolto. Em resumo, não havia razão alguma para o dólar chegar onde chegou. Pelos fundamentos, a cotação de equilíbrio era mais baixa e haveria de cair tão logo as coisas se acalmassem minimamente. Nesse ambiente, todo mundo esperava que o BC agisse apenas na taxa de câmbio, isto é, vendesse dólares ou títulos indexados ao dólar nos momentos de maior estresse. Aí vem o BC e eleva os juros de meio ponto percentual. Dá um prejuízo enorme para boa parte do mercado que estava aplicado em títulos pré-fixados, confiante no cenário positivo. Algumas estimativas dizem que há cerca de R$ 40 bilhões em papéis pre-fixados com duração em torno de sete meses. Se for isso, cada ponto percentual de aumento nos juros dá um prejuízo de R$ 400 milhões para esses investidores – pois precisariam captar a 17%, por exemplo, para financiar papéis que rendem 16%. E os juros, na confusão de quinta, 22/03, foram a mais de 20%. Além disso, as pessoas passaram a se perguntar se o BC sabia algo (grave) que o resto não sabia. O que teria acontecido de última hora para o BC abandonar seu viés otimista? E aqui entra o segundo grande grupo, dos analistas para os quais o BC fez uma grande bobagem ao elevar os juros. Para estes, o cenário certo é justamente aquele pintado previamente pelo BC – de turbulências momentâneas num quadro de bons fundamentos. Não haveria nada de mais grave acontecendo. Ao contrário, nota esse grupo: a crise argentina começa a passar do sufoco com a ação de Domingo Cavallo, os juros caíram e vão cair mais nos EUA, a crise política está amainando no Brasil, o preço da gasolina deve cair em abril e o dólar alto não provocava repasse de preços. Ou seja, os sinais imediatos apontavam para a superação da turbulência. Assim, a ação do BC simplesmente causou mais tumulto e pode causar mais inflação. Por exemplo: fabricantes que tinham alta nos custos por conta de componentes importados estavam pedindo a seus clientes um aumento de preço. O pessoal do varejo resistia com o argumento de que a alta do dólar era passageira e o ambiente geral da economia, positivo. Aí vem o BC e dá o alarme dos juros. O produtor pode argumentar: Não disse? O dólar alto é sério… Para esse pessoal, o dano pode ser alto, tanto na questão da confiança na política econômica, quanto na economia real, com perda do crescimento. Nisso tudo, o BC diz que os dois lados estão exagerando. Que por causa da alta do dólar, a meta da inflação escapou um pouquinho e o BC resolveu dar um pouquinho de juros, uma sintonia fina, para enquadrar o índice de preços. Uma simples ação preventiva. Quem tem razão? Observe o andamento das coisas nos próximos dias . . .
A POLÊMICA DOS JUROS
- Post published:9 de abril de 2007
- Post category:Coluna publicada em O Globo
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