. – Otimismo versus realismo –
O presidente Lula prevê crescimento de 4% para este ano, declara-se otimista e reclama das pessoas que, segundo ele, não gostam do seu otimismo.
Ora, por que não gostariam, já que os brasileiros parecem ter uma tendência ao otimismo?
Talvez porque as pessoas não apreciem o otimismo infundado, aquele que parece enganação ou apenas eleitoreiro. O próprio presidente dá razão a esses suspeitas quando comenta que ser otimista é da sua natureza e, além disso, uma obrigação do cargo.
É o que ele disse outro dia: ?sou corintiano, católico, brasileiro e ainda sou presidente do país, como eu poderia não ser otimista??
Ou seja, qualquer que seja a situação, Lula manifestará otimismo. Logo, não há por que tomar a sério sua visão da crise.
O retrospecto não o ajuda. Em 20 de dezembro de 2007, o presidente dizia: ?posso garantir ao povo que o crescimento em 2008 vai ser maior que em 2007 e em 2009, maior que 2008?.
Será o oposto. Neste ano, menor que em 2008 que, de sua vez, foi menor que 2007.
Alguns dirão: mas isso foi por causa da crise financeira global, que era imprevisível 13 meses atrás.
Não foi bem assim. O tamanho da crise certamente veio bem maior que o esperado, mas os sinais já estavam dados. Em agosto de 20007, havia quebrado um fundo de investimentos do BNP Paribas, por estar excessivamente exposto a papéis vinculados a hipotecas sub-prime nos EUA. Em seguida, vários outros bancos e fundos globais reportaram prejuízos semelhantes.
Mesmo não se prevendo o tsunami, havia um consenso de que a economia mundial, que vinha em um ritmo muito forte, reduziria o crescimento em 2008. A discussão aqui era justamente essa: como o país seria atingido por uma desaceleração global?
Muitos diziam que o Brasil necessariamente cresceria menos. Ainda mais porque o Banco Central insistia em seus relatórios que a economia brasileira estava crescendo acima do seu potencial. Sustentava que a demanda interna, puxada por fortíssima expansão do crédito, crescia mais rapidamente que a produção, sendo isso insustentável no médio prazo. A resposta para isso seriam juros mais altos e economia mais lenta.
E olhem que ninguém previa um desastre, mas um crescimento apenas um pouco menor, na casa dos 4,5%, por exemplo.
Foi respondendo a esses pessimistas que o presidente Lula garantiu ?ao povo? um crescimento inabalável. Pode haver esses problemas todos no mundo, mas aqui temos o PAC, insistiu o presidente em 13 de março de 2008.
Lula está, portanto, repetindo seu comportamento, dane-se o retrospecto. Deve achar que como ele não lê jornais nem acompanha noticiários de tevê e rádio, as pessoas ou fazem a mesma coisa ou não acreditam no que lêem e ouvem ou só acreditam nas falas do presidente, esta uma hipótese boa dada a enorme popularidade de Lula.
Essa popularidade, aliás, tem levado o presidente a uma espécie de soberba verbal. Ele parece achar o máximo tudo o que lhe dá na telha, incluindo essas coisas sem pé nem cabeça sobre a natureza de seu otimismo.
Também não tem o menor cabimento dizer que o presidente tem que ser otimista.
Considerem Barack Obama. Não se pode dizer que é otimista um líder que diz ao povo que acaba de elegê-lo: as coisas vão piorar em vez de melhorar. Também não se pode classificá-lo de pessimista, pois manifesta convicção de que a situação vai melhorar.
Ele consegue ser realista, apontar os graves problemas a enfrentar e, ao mesmo tempo, despertar esperança de que vai conseguir administrar a crise.
É mito melhor do que dizer que o país vai crescer porque ?eu sou otimista e garanto ao povo?.
Certamente, a situação americana é pior que a nossa. Sem dúvida, o momento de Obama é diferente. Ele está iniciando um mandato, tendo sido eleito pela oposição.
Lula está no penúltimo ano de seu mandato e tem mais é que mostrar o serviço feito. E ele tem o que mostrar. O país de fato vinha bem. Também pode botar a culpa da crise no exterior, embora isso seja admitir, indiretamente, que a bonança também vinha de fora.
O resumo da ópera: a palavra otimista do presidente não vale. Dá popularidade quando as coisas vão vem. Quando começam a ir mal, a palavra fica nua.
Publicado em O Globo, 22 de janeiro de 2009