. –A empresa paga caro, o trabalhador recebe menos e o governo leva mais e 50% do salário da carteira–
Há um critério internacional para se verificar se uma determinada economia é ou não favorável à criação de empregos. Trata-se de medir a ?cunha fiscal?, a diferença entre o que a empresa paga e quanto o trabalhador leva para casa. A cunha é a parte do governo. Quanto maior esta, menor a capacidade de geração de bons empregos. O Brasil é um dos campeões mundiais nessa conta.
No mundo todo, há na relação de trabalho formal dois impostos comuns, o imposto de renda e as contribuições para a seguridade social. É possível comparar.
No Brasil, para cada R$ 100 de salário, a empresa paga 22 reais paga o INSS e mais R$ 5,80 de contribuições sociais para Senac/Sesi, salário-educação, Sebrae e Incra. Portanto, paga mais 27,8%, ou, no caso, R$ 127,80. (Ficaram de fora os 8% do FGTS, custo da empresa, que o trabalhador recebe em algum momento).
O trabalhador parte dos 100 reais que estão registrados em sua carteira. Sobre isso, desconta 15% de Imposto de Renda (na média) e mais 11% para o INSS. Põe no bolso, portanto, R$ 74,00.
Assim, para cada 100 reais de salário, o governo brasileiro embolsa nada menos que R$ 53,80. Essa cunha fiscal de 53,8% só perde para dois países numa amostra abrangente preparada pela OCDE, Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, instituto que reúne os países mais desenvolvidos. A Bélgica é campeã, com 55,9%, sendo 21,8% de IR e 34,1% de contribuições para a seguridade social. Em segundo lugar, a Hungria, com 54.1% (sendo 38,3% de contribuições). O Brasil ocupa o honroso terceiro lugar.
Como isso afeta o nível de emprego? A consultoria LCA separou os quatro países da OCDE com as maiores cunhas fiscais e os quatro na ponta de baixo, relacionando isso com as taxas médias de desemprego nos últimos dez anos. A diferença é enorme. Nos países com o maior custo fiscal, o desemprego foi de 9%. Naquelas economias com a menor cunha, o desemprego cai para 5%.
Certamente não é esse o único fator a determinar o emprego. Mas não há dúvidas de que quanto maiores os impostos sobre a folha de salário, menor a disposição da empresa em contratar. Fica caro, reduz a competitividade do produto ou do serviço.
Esse é um claro problema do Brasil. Além de elevada, 35,8% do PIB, a carga tributária é ruim do ponto de vista da eficiência econômica e injusta com os mais pobres.
Ruim porque cobra mais impostos diretos sobre a folha de salários (8%) do que sobre a renda das empresas e das pessoas (7,3%). É o contrário do que ocorre nos países da OCDE e nos principais emergentes com os quais o Brasil compete. Nestes, a carga maior incide sobre a renda, o que faz sentido: quem ganha mais, paga mais.
Além disso, é muito grande no Brasil a proporção dos impostos indiretos (aqueles embutidos no preço das mercadorias e serviços). É injusto porque o rico e o pobre, comprando o mesmo carro ou usando a mesma quantidade de energia elétrica, pagam exatamente a mesma carga de impostos.
Resumindo, é evidente que: a carga tributária é elevada para um país de renda média com o Brasil gera ineficiência é injusta. Além disso, as empresas têm custos pesados para pagar os impostos em dia e manter a contabilidade em ordem. E tudo isso é verdade mesmo sem considerar a qualidade dos serviços prestados pelo setor público com o dinheiro que toma dos contribuintes.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, toca no ponto correto quando diz que a prioridade é reduzir os impostos sobre a folha. Só que ele diz isso desde que assumiu o Ministério, há quase três anos. Nesse tempo todo, com o país em crescimento, a arrecadação de impostos subiu todos os anos mais do que o PIB. O governo aumentou sua participação na renda nacional e esse era o bom momento para mexer em impostos. Agora que a arrecadação está caindo, enquanto aumentam as pressões sobre gastos, é praticamente impossível mexer na receita.
Não se pode reduzir a receita sem ao menos bloquear o crescimento das despesas públicas. Mas praticamente desde a Constituição de 88 que se faz o contrário, aumentam os gastos e aumentam as receitas para financiá-los.
É a opção pelo baixo crescimento.
Publicado em O Globo, 10 de julho de 2009