DUAS PRIVATIZAÇÕES – UM SUCESSO, UM DESASTRE

. DUAS PRIVATIZAÇÕES   O governo FHC embarcou em dois grandes programas de privatização na área de infraestrutura: telecomunicações e energia. A diferença não poderia ser mais escancarada: no primeiro caso, discute-se grau de eficiência, cumprimento de metas rigorosas. No segundo, discute-se a escassez e não há a menor indicação de como se vai escapar do problema. Na divisão do poder, o Ministério das Comunicações ficou com o PSDB, mais exatamente com o trator Sérgio Motta. O Ministério de Energia ficou com o PFL. Não deixa de ser curioso. Os tucanos, social-democratas, não viam com bons olhos a privatização. O próprio Sérgio Motta, ao assumir o ministério, manifestava mais dúvidas do que propostas. Mas logo se convenceu da inviabilidade financeira e técnica do modelo estatal e partiu para a privatização. O setor de telecomunicações tornou-se uma fonte de investimentos e novos negócios. Nos momentos difíceis da crise financeira internacional, foi o único que se manteve em expansão, salvando o país de uma recessão. Hoje, claro, há problemas no setor. Mas não se discute escassez, discute-se qualidade e ampliação dos serviços. Há investimentos em andamento e sendo programados. Já o setor de energia ficou com um partido que leva o liberal no nome. Mas que ficou enrolado na fisiologia política – a quantidade de cargos e o poder regional oferecido pelas grandes estatais. A privatização que mais avançou foi na distribuição de energia – setor que estava nas mãos de estatais estaduais. Ocorreu que os governos estaduais, atolados num buraco financeiro inadministrável, foram praticamente obrigados a vender suas empresas para abater dívida. Na verdade, pode-se dizer que o Ministério da Fazenda foi o responsável por essa privatização. Na renegociação das dívidas estaduais, a área econômica estabeleceu regras segundo as quais quanto mais os governos estaduais privatizassem e quanto mais caixa fizessem para dar de entrada, menores seriam as prestações mensais e as taxas de juros. Já a geração de energia, onde se localiza a crise, está basicamente sob controle de estatais federais. Com uma exceção, em São Paulo, onde o governo detinha grandes geradoras. Pois foi em São Paulo, onde o também tucano Mario Covas tinha as mesmas dúvidas que Sérgio Motta, que a privatização dessas geradoras mais andou. Na área federal, sob controle do PFL, reinou a indefinição. O último exemplo é flagrante: anuncia-se que o racionamento de energia começa em 1o. de junho, mas não se informam as regras. A 20 dias dos cortes no fornecimento, famílias e empresas não sabem como se programar. Outro exemplo: a maior geradora nacional é Furnas, federal. Está no programa de privatização há seis anos, mas só oficialmente. Na prática, todo mundo sabe que o governo já desistiu, por razões eleitorais, por resistência da corporação, porque os políticos do Norte e Nordeste não querem perder o controle das empresas. Outro exemplo: em 1999, quando ficou claro que a geração hidroelétrica estava comprometida, o Ministério de Minas e Energia lançou um programa de construção de 49 usinas térmicas, a gás. Mas nem 15 projetos estão em andamento. Problema: o preço do gás, que vem da Bolívia e da Argentina, é medido em dólares, mas qual dólar? Como se coloca o custo do gás em dólares nas tarifas? Sem saber isso, é claro que ninguém investe. Aliás, a distribuidora de energia AES, empresa americana que controla a Eletropaulo, acaba de engavetar investimentos de US$ 2 bilhões, reclamando da falta de regras no setor. Em especial, a companhia reclama que a Agência Nacional de Energia Elétrica, Aneel, não repassa certos custos para as tarifas, como a alta do dólar. (As distribuidoras compram energia de Itaipu que, por ser binacional – de propriedade do Brasil e do Paraguai – cobra em dólares). Eis aí: indefinição quanto ao processo de privatização, indefinição quanto às tarifas, indefinição quanto ao racionamento. Se a gente precisasse aoenas de um desastre, esse não serviria. É um monumental desastre – que simplesmente vai atrasar o crescimento econômico.

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