. –O mercado acha que o governo Lula vai cumprir a meta de superávit primário empresários acham que o governo vai é gastar–
Para ficar apenas no noticiário mais recente, o governo Lula quer capitalizar, ou seja, colocar mais dinheiro na Petrobrás, Eletrobrás, Telebrás, Banco do Brasil, Caixa, BNDES e em um novo banco de banco de financiamento à exportação. Também quer gastar dinheiro, na forma de subsídios a compradores e financiamento a empreiteiras, para ?acabar com o maldito déficit habitacional?, como disse na última sexta. Acrescente aí os compromissos com aumento real do salário mínimo e das demais aposentadorias, com a ampliação das Bolsas e com os reajustes do funcionalismo, mais as mega-obras do PAC, como o trem bala e a transposição do rio São Francisco, e se verifica que, sem fazer contas, o governo não tem dinheiro para isso tudo.
Há algumas engenharias financeiras ou, simplesmente, truques, em andamento, como essa idéia do governo capitalizar a Petrobrás ?pagando? com barris do petróleo do pré-sal que ainda não existem. Mas continuam enroladas. Já o endividamento do Tesouro existe. O governo andou lançando uns papagaios na praça para emprestar ao BNDES ? o que aumentou a dívida pública bruta, a qual, aliás, já se aproxima perigosamente dos limites. Ou seja, é um artifício de pouco uso daqui em diante, se o governo pretende, como promete, manter a estabilidade das contas públicas.
Também há, ou havia, promessas de aliviar a carga tributária de alguns setores, como o de exportação, o que também significa custo para o Tesouro.
De novo, a conta real não fecha com as promessas.
E aí?
Aí que muita coisa simplesmente não vai acontecer. O pacote de apoio à exportação, por exemplo, saiu bem mixuruca. A principal reivindicação dos exportadores é poder compensar automaticamente os impostos que pagam indevidamente. A exportação é isenta, mas quando o exportador compra insumos e partes, esses produtos vêem com impostos embutidos no preço, dado o nosso sistema, perverso, de cobrar antecipadamente.
Com isso, os exportadores ficam com uma espécie de crédito, que gostariam de descontar automaticamente de outros impostos, devidos sobre comércio local, por exemplo. Gostariam, também, de poder vender esses crédito de maneira simples e rápida.
Mas não saiu. Ficou o sistema antigo, pelo qual o exportador tem de praticamente implorar a devolução. Entra na fila, e aí já viu.
E por que não mudaram a regra, se todos estão de acordo que é preciso apoiar a exportação? Porque o governo precisa do dinheiro para os gastos já contratados, Previdência, pessoal, programas sociais e custeio, que levam mais de 90% das receitas líquidas do governo federal.
Ou seja, eis a alternativa: ou o presidente Lula se convenceu de que ganhou uma licença para gastar e deixou de lado as metas de superávit primário e de redução do endividamento público, ou esse amontoado de planos e promessas não passa de agitação e propaganda.
O mercado, que o presidente Lula e seus companheiros adoram atacar, acredita piamente na promessa de austeridade que está no orçamento: superávit primário de 3,3% do PIB (contra menos de 1% no ano passado) e redução da dívida líquida do setor público de 41,5 para 39,5% do PIB, com juros em alta e inflação contida. É o cenário que aparece no Relatório de Mercado, publicado pelo Banco Central, com base nos cenários desenhados por instituições financeiras e consultorias.
Por outro lado, o setor produtivo, especialmente entre aqueles que dependem de encomendas do governo e das estatais, acredita piamente que o dinheiro para seus negócios vai pintar.
Um dos dois vai se decepcionar. Capaz de os dois se decepcionarem, o que seria o pior cenário para o país.
Fixação
Parece que dois sentimentos movem a atividade externa do presidente Lula. Um é a fixação nos Estados Unidos. O outro é uma espécie de teimosia, que o leva a dobrar a aposta toda vez que é criticado.
Dirão: como fixação se o presidente não perde a oportunidade para atacar ?a subserviência? aos EUA? Pois é justamente isso, uma fixação ao revés. Lembram-se daquela diplomacia do regime militar ?o que é bom para os EUA é bom para o Brasil?? Troquem um ?bom? por um ?ruim? ? e eis o comportamento atual.
Quanto ao segundo sentimento, basta observar as reações do presidente. Quanto mais criticam, por exemplo, sua futura visita ao Irã, mais Lula anuncia que vai lá, que vai falar isso e aquilo e que, para não perder o embalo, não vai deixar de ir só porque os EUA não querem.
Na última sexta, por exemplo, Lula disse que era ?subserviência? aceitar a tese de que a paz no Oriente Médio depende dos Estados Unidos. Por isso, o Brasil está se metendo na história.
E se dizem que a capacidade da diplomacia brasileira por lá é muitíssimo limitada, Lula acusa os críticos de sentimento de inferioridade e declara que vai fazer muito mais pela paz.
Bobagem, portanto, querer discutir a eficiência dessa política externa. A coisa não passa por essas racionalidades.
Publicado em O Estado de S.Paulo, 29 de março de 2010