OS PERIGOS DA QUEBRA DO SIGILO PELA RECEITA

. Sigilo fiscal Mais de 100 funcionários da Receita Federal estão sendo investigados pela Corregedoria da própria Receita. Motivo: esses funcionários andaram acessando os dados fiscais sigilosos de determinadas pessoas, sem que houvesse qualquer processo ou investigação a respeito. Entre aquelas pessoas estão o próprio secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, e outros nomes da alta direção do órgão. Por que razão um funcionário da Receita resolveria dar uma espiada nos dados fiscais de seu chefe? Política, por exemplo. O sindicato dos auditores fiscais tem radicalizado nas suas reivindicações e mantém relação de intenso conflito com o secretário Maciel. Mexer nos dados do chefe pode ser uma tentativa de intimidação, algo do tipo "nós sabemos"- ou ainda "nós podemos passar isso para a imprensa". É nula a possibilidade de que Everardo Maciel tenha cometido uma irregularidade sequer em sua declaração de renda. Mas e daí? Não faltam jornais dispostos a publicar a declaração do secretário com títulos do tipo "patrimônio de Maciel cresceu tanto em tanto tempo". Não quer dizer nada, não prova nada, mas vai todo mundo em cima do secretário pedindo que ele dê explicações. Talvez alguns deputados peçam CPI e, óbvio, alguns procuradores iniciem investigação. Exatamente a mesma coisa pode ser feita com qualquer pessoa – e isso recoloca a discussão sobre a legislação que autoriza o fiscal da Receita a acessar o sigilo bancário de qualquer pessoal sem autorização da Justiça.. O governo federal editou decreto regulamentando esse acesso e especificando penas para o funcionário da Receita que deixar vazar dados sigilosos obtidos por ele no curso de uma investigação. O secretário Maciel tem garantido que a Receita será guardiã do sigilo a que tiver acesso. Será? Os funcionários da Receita que andaram bisbilhotando as declerações de seu chefe precisam utilizar suas senhas pessoais para entrar no arquivo. A senha fica lá registrada e é assim que a Corregedoria está investigando. Ora, é óbvio que os funcionários sabem que suas senhas ficam lá, como prova. E mesmo assim, vão em frente. Ou seja, eles não têm medo de punições. Devem se sentir protegidos pela legislação. Pode-se dizer que, por ora, não há nada a punir, pois nada aconteceu. O pessoal acessou dados e não os utilizou. Mas a norma é clara: nenhum funcionário da Receita pode entrar nos dados sigilosos de qualquer contribuinte se não tiver motivo para isso (um processo em curso, uma investigação, enfim, um ato regular). Além disso, há outro possível problema. Se vários funcionários acessaram os dados de uma mesma pessoa – e se esses dados vazarem para a imprensa, como saber qual funcionário passou os dados adiante? Note que o repórter tem o direito legal de não revelar qual foi sua fonte. Eis aí por que é muito arriscado que a Receita tenha acesso a mais dados sigilosos – agora os dados bancários – sem necessidade de pedir autorização judicial. O Judiciário limita esses acessos, exige que o pedido de quebra de sigilo seja muito bem fundamentado, que haja indícios de crime financeiro e não apenas suspeitas. Já se vê que muita gente da Receita não terá esse rigor. Não ajuda o secretário Maciel dizer que vazamentos e acessos ilegais serão fiscalizados e rigorsamente punidos. Se eles olham os dados do próprio chefe e não lhes acontece nada . . . (Correção: na nota anterior a esta, Dedo na Ferida, saiu uma informação errada. O Senado tem 81 senadores e não 69. São três senadores para cada um dos 26 Estados e mais três pelo Distrito Federal).

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