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A Justiça que nunca acaba

No início deste mês, a segunda turma do STF tomou uma decisão  com votação idêntica à da última terça, quando foram derrubados os habeas corpus para mandar Lula para casa. O assunto era outro – a denúncia contra três deputados e um senador  – mas o contexto era o mesmo: a Lava Jato. No placar, os mesmos três votos (Edson Fachin, Cármen Lúcia e Celso de Mello) aceitando a denúncia e negando os HCs e os mesmos dois votos (Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski) rejeitando a denúncia e concedendo os HCs.

Há algo aí além do Direito. Claro que os juízes têm teses diferentes, mas isso normalmente ocorre dentro de uma base comum. A questão do aborto, por exemplo. As diferenças aparecem em torno de pontos básicos – direito à vida, momento em que começa a vida, direitos da mãe.

Nos casos da Lava Jato, é tudo ou nada. Tratei do assunto na coluna de 13 de junho, mostrando que onde Gilmar Mendes via na denúncia contra os parlamentares um amontoado de equívocos, os outros três ministros encontravam  indícios relevantes de prática de crime.

Comentei que o voto de Gilmar Mendes -incluindo ataques a Moro – parecia feito sob medida para desqualificar a denúncia da Lava Jato, qualquer que fosse, já que seu objetivo era derrotar o “direito penal de Curitiba”.

Conversei com o ministro. Ele disse que os assuntos jurídicos eram muito complexos e que, a rigor, não havia o certo e o errado em Direito, mas teses diferentes.

Respondi que o voto e a fala dele indicavam exatamente o contrário, que ele acreditava estar certo e todos os demais, incluindo o jornalista, equivocados.

E perguntei especificamente o que ele, Gilmar Mendes, achava do voto de Fachin. Respondeu que Fachin era de Curitiba e de certo modo tinha que se alinhar à Lava Jato. Mas e o Celso de Mello que, a propósito, é de Tietê? Gilmar disse que Mello poderia estar fazendo uma homenagem a Fachin.

Ficou por aí.

Quer dizer, ficou nada, pois na última terça o filme se repetiu. E por três a dois, Lula continua na cadeia e o STF entra em férias.

Todo mundo no STF diz que a corte não pode fulanizar os temas, isso querendo dizer que não se trata de Lula, mas de teses.

Não é verdade. Trata-se, sim, do embate Lava Jato x Lula. E não por exemplo, Lava Jato x Eduardo Cunha ou versus Geddel ou versus Odebrecht.

E parece um caso infinito. Apesar de todos os pedidos da defesa de Lula já terem sido julgados – e derrotados – nas quatro instâncias da Justiça, não tem nada fechado de vez.

Ora, como nota José Paulo Cavalcanti Filho, depois da Primeira Instância, o exame das provas é todo feito novamente por um tribunal superior, no caso (de Lula) pelo TRF-4 de Porto Alegre. Esse Tribunal também deliberou sobre o mérito, os fundamentos da sentença, sendo essa decisão confirmada no STJ e no STF.

E ainda assim não acabou?

Lembra ainda Cavalcanti Filho que tudo isso  acontece porque a “legislação brasileira não é a mesma dos países com democracias maduras”. Na Alemanha, Canadá, Espanha, Estados Unidos, França e Inglaterra, por exemplo, a sentença de primeira instância é suficiente para levar o cidadão à prisão.

Aqui, a rigor, nem sabemos se a última instância serve. O STF decidiu que a segunda instância basta, mas o presidente da Corte já disse que o assunto vai ser revisitado. E todo mundo sabe que, se mudar, será para criar mais uma instância. E livrar Lula?

Eis o ponto de novo. O STF adia as respostas porque teme tanto confirmar de vez a prisão de Lula quanto condenar a Lava Jato.

Enquanto isso, para sorte do país, a Lava Jato segue. A Advocacia Geral da União acaba de fechar a primeira negociação global no âmbito da Operação Lava Jato, um acordo de R$ 1,13 bilhão a ser pago pela Technip Brasil e pela Flexibras. É o oitavo acordo de leniência. Retorno previsto aos cofres públicos, R$ 10 bilhões.

Por outro lado, o velho direito também está por aí. O senador Ari Gurgacz, em regime de prisão aberta, foi autorizado pela Justiça do DF a passar férias num resort/cassino em Aruba. Capaz de ir com verba do Senado.